Filosofia para os jovens
Pretendo com este texto pensar uma filosofia para os jovens do nosso século. Considerem que escrevo uma filosofia para os jovens e não uma filosofia para jovens. Vamos apresentar as esperanças, decepções e possibilidades de ação que possuem os jovens hoje.
Quais são os problemas que a juventude enfrenta? Quais as dificuldades em ser jovem? Três questões se mostram:
Estudos e Ascensão Social
Menos de um século atrás, uma estimativa nos diria que apenas 10% dos jovens chegavam ao ensino superior. Os 90% restante compunham a classe trabalhadora e pobre. Frequentar a universidade e possuir um diploma era um diferenciador social. Mas isso mudou.
Hoje, em países desenvolvidos, estima-se que mais de 80% dos jovens vão para o ensino superior. Em países em desenvolvimento, como o Brasil, apenas 50%. É uma diferença considerável, mas ainda assim um crescimento em relação às décadas anteriores.
Porém, se antes o diploma representava o meio de ascensão social, hoje já não é mais assim. Com a democratização da universidade, o mercado não foi capaz de acolher a todos. Passou-se a exigir níveis ainda mais altos e especializados de formação: inúmeras pós-graduações, estudos e experiência no exterior etc.
Sabemos que os jovens da camada pobre e média que recentemente conseguiram o diploma não conseguem acompanhar a crescente exigência. Jovens de periferia não podem passar uma ou duas décadas estudando e viajando o mundo porque tem preocupações mais imediatas, como conseguir um emprego para sobreviver. Deste modo, os mecanismos de diferenciação de classe permanecem.
Se o nível da educação média aumentou, isso não foi acompanhado por um aumento das oportunidades. Consequentemente, a educação adentrou a lógica de mercado. Vista como um investimento – o maior investimento da sua vida, diriam alguns – instituições encontraram a oportunidade de venderem cursos e diplomas dos mais variados, que funcionariam como um passaporte para a tal ascensão social. O que nem sempre se confirma.
Há hoje muitos jovens com estudos, diplomas e formações, mas sem um real espaço para eles na sociedade.
Adolescência Prolongada
Completar 18 anos, servir o exército, conseguir um emprego, casar-se, comprar uma casa e construir sua família. Para as gerações anteriores este era o caminho comum e alcançável pelos jovens em poucos anos. Mas hoje também não é mais assim.
Primeiramente, pelo alto custo da vida moderna. Por exemplo, comprar uma casa é impossível para jovens que mal conseguem alugar um apartamento compartilhado com os amigos num grande centro urbano. Isto, somado às faltas de boas oportunidades de trabalho, faz com que os jovens passem dos seus 30 anos e ainda permaneçam economicamente dependentes dos seus pais. O que não é sem frustração para pais e filhos.
Como consequência, há a chamada adolescência prolongada, que não é nada mais do que a falta de ritos de passagem para a vida adulta.
Nas sociedades antigas sempre existiram os ritos que marcavam a passagem dos jovens à vida adulta. No caso dos meninos, até algumas décadas atrás era o serviço militar para a classe trabalhadora e a formação universitária para a classe média. Para as meninas era o casamento e a maternidade. Felizmente, o movimento feminista questionou isso por seu inerente machismo.
No entanto, o fracasso contemporâneo da sociedade em introduzir o jovem na vida adulta, seja pela educação ou pelo trabalho, impede que algum rito de passagem seja realizado. Com a adolescência prolongada, a única diferença entre jovens de 15 e 35 anos hoje é que os últimos geralmente tem mais dinheiro para comprar PlayStations.
Jovenismo
Não só há uma adolescência prolongada, como também uma grande recusa dos adultos em envelhecer. Sobretudo fisicamente.
Nas sociedades antigas, os velhos eram vistos como sábios. O arquétipo do ancião reflete alguém que adquiriu sabedoria por muitos anos. Mas não é assim num mundo de constantes revoluções tecnológicas. Se o saber do velho era algo que antes podia instruir os jovens, hoje os idosos se mostram incapazes de se situar no mundo. Há na verdade uma inversão. Os velhos que precisam dos jovens até para as coisas mais banais, como pagar suas contas no banco.
Cresce assim a ideia de que a vida é para os jovens. É preciso ser jovem e ter disposição para aproveitar a vida e seus prazeres. Sobretudo da beleza, vista como um atributo finito da juventude, e que se tenta prolongá-la ao máximo.
Os próprios idosos aderem a esse discurso quando se fala da importância de se manterem ativos e saudáveis até o fim da vida. A doença e o enfraquecimento da velhice são vistos como moralmente reprováveis, como se fosse uma questão de escolha pessoal, e não uma contingência natural da vida.
E quem lucra com isso é a indústria da beleza. Massificação de cosméticos e processos cirúrgicos, vídeos de dicas de maquiagem com milhares de visualização, profissionais do fitness com mais seguidores que as próprias estrelas do cinema. Todos buscando uma mesma coisa: retardar a marcha do tempo e cultuar os atributos da juventude, a beleza e a energia.
O grande desafio dessa geração não será manter a juventude eterna, mas, depois que tudo falhar, conseguir aceitar em paz o envelhecimento e o fim do jovenismo.
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Se o cenário parece desolador, é porque já estamos fazendo filosofia.
Essa é a diferença entre autoajuda e filosofia. A primeira tenta fazer com que você ignore a realidade e permaneça confiante e positivo. A segunda nos convoca a olhar com seriedade para o buraco em que nos metemos, e pensar como podemos sair dele.
Não há soluções fáceis. Mas essa é a vantagem da juventude. Ela tem a disposição e a coragem de mudar o mundo, enquanto a maturidade nos faz aceitar as pequenas conquistas que conseguimos para nos sentirmos satisfeitos. Pois aproveitemos então a insatisfação da juventude para pensar numa saída filosófica que:
- Questione o sistema educacional mercantilista, que transformou o saber numa feira para vender diplomas, muitas vezes inúteis;
- Compreenda que nossa vida não pode ser guiada pelo mesmo modelo das gerações anteriores, e que um novo tipo de existência social precisa ser inventado;
- Que saiba gozar dos prazeres, mas saiba que eles têm seu fim. E os maiores prazeres não estão na beleza de um corpo enquanto jovem, mas no amor por uma vida inteira.
Igor Teo é psicanalista e escritor. Para saber mais acesse o seu site pessoal.
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Crédito da imagem: MD Duran/Unsplash
Marcadores: beleza, Colunista: Igor Teo, colunistas, educação, existência, filosofia
3 comentários:
Cara não tenho o que falar desse texto (filosofia para os jovens) foi algo que me fez realmente pensar realmente tentar entender esse mundo louco que vou entrar em um ano (estou no segundo ano do ensino médio) e é difícil porque você se sente perdido nunca sabe o que fazer e tem uma pressão constante de acabar o ensino médio e já ir para um superior.
Yan, o que podemos recomendar é que tente encontrar o que gosta de fazer. Claro que nem sempre é simples a escolha, principalmente quando precisamos levar em conta que ainda precisamos ter um salário razoável. Mas, quanto mais você estiver disposto a sacrificar da sua expectativa salarial em prol de ter um leque maior de opções, mais chances terá de acabar trabalhando com o que de fato gosta. Ou seja, saber viver com pouco é sempre uma virtude nos tempos atuais. Aliás, não é rico quem tem muito, mas sim quem precisa de pouco, tendo quase sempre o suficiente... Abs!
Estou envelhecendo, percebo a mudança na minha pele e músculos e mesmo não me rendendo aos apelos estéticos de hoje, está sendo um desafio, manter a mente longe da cobrança de não envelhecer.
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