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16.7.19

Traduzindo o Imperador

Vocês devem ter reparado que faz algum tempo que não temos um novo lançamento nas Edições Textos para Reflexão. Isto porque faz alguns meses que eu estou me dedicando quase que exclusivamente à tradução de Meditações de Marco Aurélio, o imperador de Roma (a partir da versão inglesa de George Long).

Além de ter sido o último imperador da chamada Pax Romana, um longo período de relativa paz e progresso no Império Romano, Marco Aurélio é um dos expoentes do estoicismo, uma vertente filosófica originária na Grécia no século 3 a.C. que exerceu profunda influência na ética cristã. Assim, se trata quem sabe do homem que mais se aproximou do ideal de “rei-filósofo” cunhado na República de Platão.

Estou com aproximadamente 2/3 da tradução concluída, espero publicar na Amazon (em e-book e impresso!) em no máximo dois meses... Abaixo, trago alguns trechos retirados dos primeiros livros (ou capítulos) da minha tradução, e também a capa:


Livro II, trecho I

Inicie a manhã dizendo para si mesmo: hoje devo cruzar meu caminho com os intrometidos, os ingratos, os arrogantes, os traiçoeiros, os invejosos e os mal-humorados. Tudo isso lhes afeta pelo fato de serem ignorantes do bem e do mal. Eu, porém, que contemplei a natureza do bem, e vi a beleza, e que igualmente observei o mal, e percebi o seu horror, e que ainda refleti sobre a natureza daqueles que incorrem no erro, e descobri que eles também me são aparentados, não somente pelo sangue ou pelo nascimento, mas por participarem da mesma inteligência e da mesma origem divina, já não posso temer que me causem dano algum.
Pois que ninguém [além de mim] pode reformar o meu próprio mal, tampouco eu poderia me zangar com um parente, muito menos odiá-lo. Pois que nós fomos criados para a cooperação mútua, como os pés, as mãos, as pálpebras, os dentes superiores e inferiores.
Assim, agir contra o próximo é algo contrário à natureza, e deve ser evitado.


Livro II, trecho XII

Quão rápido todas as coisas desvanecem: em todo o universo, os próprios corpos, e no tempo, a lembrança deles. O que será a natureza de todas as coisas sensíveis, particularmente aquelas que nos atraem pela isca do prazer, ou nos aterrorizam pela dor, ou ainda aquelas cujo brilho passageiro nos desatina?
Quão sem valor, desprezíveis, sórdidas, perecíveis e mortas: cabe a nossa faculdade intelectual tomar consciência disto. E igualmente observar a quem as opiniões e os buchichos conferem fama; e refletir acerca do que é a morte, e o fato de, se um homem a encara em si mesmo, e por um poder de abstração reflexiva, a separa de todos os fantasmas imaginários que lhe associamos, ele então enfim perceberá que ela é nada mais do que uma operação da natureza; e se alguém tem medo de uma operação natural, é infantil. No entanto, a morte não é apenas uma operação da natureza, mas também algo que conduz ao seu cumprimento. [...]


Livro IV, trecho XLIX

Seja como às rochas contra as quais as ondas se quebram incessantemente, mantenha-se firme e domestica a fúria das águas ao seu redor.
Estou infeliz porque este infortúnio me ocorreu? Pelo contrário, estou satisfeito! E minha satisfação decorre do fato de que, apesar de tal infortúnio haver se sucedido em minha vida, eu continuo livre do sofrimento, nem revoltado com o dia de hoje, nem temeroso quanto ao futuro.
Pois que tal infortúnio poderia ocorrer na vida de qualquer homem, mas nem todos os homens se conservariam livres do sofrimento ante tal evento. Por que então este evento seria um infortúnio, e aquele outro, uma sorte?
E como você julgaria qualquer evento um infortúnio, se ele não desvia um homem da sua natureza? E acaso algo lhe parece como um desvio da natureza de um homem, se não é contrário à vontade da própria natureza? Ora, você conhece a vontade da natureza – terá, então, isto que se passou o impedido de continuar sendo justo, magnânimo, moderado, prudente, protegido contra a irreflexão e a falsidade? Terá roubado a sua modéstia, a sua liberdade, e tudo o mais que constitui o caráter essencial da sua natureza?
Assim sendo, lembre-se de aplicar tal princípio em cada ocasião que possa lhe causar aborrecimento: tal evento não é em si mesmo um infortúnio, nem motivo de infelicidade, mas poder suportá-lo com coragem é ao mesmo tempo uma sorte e um motivo de satisfação.


Livro V, trecho XXVII

Viva junto aos deuses. Vive próximo aos deuses aquele que lhes mostra diuturnamente que a sua alma se encontra satisfeita com a sua própria sorte, realizando tudo o que determina o seu daemon, que Zeus conferiu a cada homem como um guardião e um guia, uma parte da sua divindade. E ele se reflete em nossa razão e em nossa sabedoria.

Meditações de Marco Aurélio; tradução de Rafael Arrais
(em breve, na Amazon e outras lojas...)


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Crédito da imagem [no topo]: Google Image Search

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