Pular para conteúdo
4.9.12

Palavras de Iemanjá dos Navegantes

Há muitas aldeias no mundo
E eu que sinto como o oceano
Fluo e conecto a todas elas
Fluo e preencho o ser humano

Por muito tempo, há muito tempo, criei caçadores ferozes
E amamentei a cada um deles em meu seio;
Por muito tempo, como os navegantes do mar
Despedia-me de meus filhos antes de cada caçada
E chorava junto as suas mães
Por todo caçador que não pôde retornar

Quantas feras, quantos monstros, quanto sangue
Há no horizonte além das aldeias
Foi para cruzar tal horizonte, e capturar tais feras pelos matagais
Que muitas mulheres choraram por seus homens:
Os caçadores ancestrais

E quando meus filhos aprenderam a plantar sementes
Sorrimos eu e o sol, e cuidamos para que minha noite
Desse sempre lugar ao seu dia
E que as estações fluíssem como as correntes do mar
Sempre circulando, e circulando...
A todas as aldeias conectando

Há muitas aldeias no mundo
E eu que trago as chuvas para o chão
Fluo e amamento todas as suas raízes
Fluo e faço o milagre da plantação

Por muito tempo, há muito tempo, cuidamos deste pomar
E fomos não somente mães, mas rainhas xamãs;
Por muito tempo, como os navegantes da mente
Aguardava minhas filhas em sonhos de luz
E chorava de saudade quando vinham a despertar
Pouco antes de o sol nascer, além do mar...

Mas então veio a bonança, e com ela as verduras e os grãos
E as primeiras grandes aldeias, onde nem todos necessitavam caçar;
Houve alguns que acreditaram estar no Céu
Onde todos se davam as mãos...

Mas então vieram também os outros caçadores
Perdidos a vagar pelo horizonte selvagem
Que entravam nas grandes aldeias
Para saquear e matar
Aqueles que não podiam revidar

E quando os outros perdidos se ofereceram para proteger as grandes aldeias
Choramos eu e o sol, e cuidamos para que minha noite
Viesse a refrescar brevemente aos banhos de sangue
Que os primeiros exércitos de homens infligiam uns aos outros
E a própria vida como um todo

Sei disso, pois estou tanto na primeira divisão do óvulo
Quanto na última gota de sangue a se esvair de seus templos...
Quantos cadáveres se amontoaram desde então
Nos campo de batalhas, no entorno das aldeias
E mesmo longe delas, na imensidão?

Há muitas aldeias no mundo
E eu que sou substância como o espírito
Fluo e desperto toda a poesia
Fluo e amo a todos vocês:
Caçadores e xamãs;
Amo-os como mulher
Como mãe
Como todo um oceano
Na mais profunda calmaria

Odoya, Odoya, Iemanjá dos navegantes, senhora do coração, sereia do mar!


Um conto inspirado em Iemanjá. Através de raph em 2012.

***

» Parte da série "Voz dos Orixás"

Crédito da imagem: Google Image Search

Marcadores: , , , , ,

2 comentários:

Anonymous Samuel Otemi disse...

É bem possível fazer analogia do fluido universal/ boson de higgs e a energia feminina/deusa e a serpente, ja que todos esses elementos unifica e mantêm unidas todas as coisas e além disso cria a própria vida.
Lembrando do gênesis, lá dizia más ou menos, no início só havia escuridão no abismo e o espírito do senhor pairava sobre as águas.
É interessante é que o masculino e o feminino esta indissociado no caos primitivos e ao refletir um no outro gera todo um mundo o pairar sobre as "águas" é essa lúz refletida nas águas a moldar e criar a vida de sua própria essência. O mundo tem aminésia em relação a isto, que as águas se manifestam em Deus e Deus se manifesta nas águas, qualquer polarização acabamos não encontrando nenhum, nem outro.O caçador que na poesia "esquece" e acaba matando a si mesmo e os outros, e o mesmo que sente que tem algo fora do lugar e procura voltar para luz e para as águas originais mais já está cego para os caminhos que antes traçados já não existem pelo menos para seus olhos. Outros caminhos virão, mas lúcidos quem sabe?. Como sempre, grandes sequencias de textos.Valeu Rafael.

4/9/12 21:56  
Blogger raph disse...

Eu fico orgulhoso desses meus leitores que conseguem encontrar todas essas conexões entre os grupos de posts.

E é realmente isso, parece que minha inspiração vai se "conectando" a certos temas, de modo que um post vai "chamando" o outro na sequencia.

Embora nem sempre isso se dê conscientemente. Muitas vezes só reparo algumas coisas quando vocês comentam :)

Abs
raph

4/9/12 23:07  

Postar um comentário

Toda reflexão é bem-vinda:

‹ Voltar a Home