Vida 1.0
Em um dos episódios da saudosa série de TV Cosmos, Carl Sagan inicia dizendo a seguinte frase: "Se você quiser fazer uma torta de maçã a partir do zero, você precisará primeiro inventar o universo."
De fato, como Parmênides bem definiu, ex nihilo nihil fit (do nada, nada se faz). Essa é uma questão que talvez ainda esteja além de nossa ciência por um bom tempo – talvez mesmo para sempre. Já a questão do surgimento da vida a partir de matéria inorgânica possa ser resolvida nalgum dia, pelo menos é algo que pela lógica nos parece mais viável, embora estejamos ainda muito distantes de desvelar tal mistério.
Uma das teorias mais consideradas sobre a origem da vida na Terra é a panspermia. Ela trata da hipótese segundo a qual as sementes de vida são prevalentes em todo o Universo e que a vida na Terra começou quando uma dessas sementes aqui chegou, provavelmente “na cauda de um cometa”. Em “O Universo Vivo” Chris Impey nos esclarece melhor a questão:
“Tanto cometas quanto meteoros podem transportar moléculas complexas para a Terra. Surpreendentemente, quando os cientistas simulam impactos, os aminoácidos não só sobrevivem ao choque, mas muitos se unem para formar polipeptídios ou mini-proteínas – intimamente ligados à origem da vida.
Os meteoritos também trazem um ingrediente vital: o fósforo. Esse elemento reativo é o quinto mais importante elemento biológico depois de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, embora sua produção pelas estrelas seja bem pequena. O fósforo é decisivo para a vida porque forma a espinha dorsal do DNA, e também é o ingrediente principal do ATP – trifosfato de adenosina – o combustível fundamental da vida.”
A panspermia procura solucionar um problema corrente nas teorias do surgimento da vida na Terra – ocorre que nas condições iniciais do planeta, provavelmente não tínhamos elementos suficientes para explicar sua obscura origem. Para o “milagre da primeira célula”, é preciso recorrer a elementos alienígenas. Vejamos o que Impey tem a dizer:
“A vida hoje não se parece com substâncias químicas flutuando em uma lagoa salgada, ou com moléculas complexas aprisionadas em uma superfície mineral. Todas as formas de vida, da menor bactéria até a sequóia mais imponente, são feitas de células. Depois que uma célula primitiva foi criada, o caminho para o alto ficou claro. Certamente ir de uma bactéria a um chimpanzé é um passo menor do que ir de uma mistura de aminoácidos a uma bactéria. Saber como se formaram às primeiras células é vital para que a ciência compreenda a origem da vida.
Mas essa questão ainda permanece em aberto. Apesar de nos dias atuais a ciência pelo menos fazer uma idéia básica de como o processo provavelmente se conduziu, nunca vimos moléculas se reproduzindo, nunca produzimos uma célula sequer a partir de elementos sem vida.”
Em suma: o mecanismo pelo qual as bactérias evoluíram ao longo dos milhões de anos de vida na Terra até a incrível diversidade biológica que encontramos atualmente, este é bem fundamentado pela revolução do pensamento e da ciência a partir da teoria de Darwin-Wallace. Já o mecanismo que deu efetivamente origem a vida, e que transformou matéria inanimada em células orgânicas complexas, possibilitando o surgimento do RNA e do DNA, este ainda intriga a comunidade científica, e não sabemos ainda quando poderá ser compreendido.
Entretanto, não há motivo para imaginar que o homem nunca irá solucionar tal enigma. Se considerarmos o ano cósmico – todo o tempo do universo comprimido em um ano imaginário – faltando 20 segundos para meia-noite, os hominídios evoluem para se tornar exatamente como nós, inventam as ferramentas e a agricultura, e constroem as primeiras cidades. A Revolução Coperniciana acontece quando falta um segundo para a meia-noite. A teoria de Darwin-Wallace e a biologia surgem dentro desses centésimos de segundo já no finalzinho do ano... Ou seja: se é verdade que a evolução da vida levou bilhões de anos na Terra, também é verdade que chegamos a um estágio inimaginável, uma verdadeira ebulição da informação e do conhecimento humano acerca do grande Cosmos a sua volta.
Carl Sagan dizia que “nós somos uma forma do Cosmos conhecer a si mesmo”. Pois bem, até pouco tempo atrás a vida evoluiu por si mesma, no que costumamos chamar de “evolução natural”. A vida permitiu que seres humanos pudessem evoluir para chegar ao conhecimento necessário para descobrir o DNA, clonar algumas espécies e seqüênciar seu próprio genoma... Mas nesse momento chegamos ao anúncio de Craig Venter: a primeira forma de vida auto-replicante, a primeira bactéria “artificial” foi “criada” pelos cientistas de sua equipe.
Até aqui estivemos na Vida 1.0, agora chegamos a Vida 2.0
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Crédito da foto: Nepmet
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2 comentários:
Há também que se considerar a possibilidade de haver vida no universo baseado em elementos totalmente diferentes da vida Terrícola. Na própria Terra encontramos uma bactéria que incorpora arsênico - molécula altamente tóxica para a vida comum - à seu DNA.Quem sabe que tipos de elementos devem ter se formado há bilhões de anos-luz de nós? E quantas condições diferentes (pressão,tempo...) não se passam por aí a fora? Lembremo-nos que um dos nomes do Cosmos é diversidade! calor, gravidade,
Sim, a partir da descoberta da vida nas fossas abissais do oceano, em torno das "fontes termais" que são os vulcões profundos, e também a partir da descoberta da vida mesmo nas profundezas mais congeladas da Antrártica (no entanto, na parte líquida), inclusive de organismos que sequer dependem de luz para sobreviver, os biólogos e cosmobiólogos têm considerado essas possibilidades de vida não somente alienígena em relação ao planeta Terra, mas alienígena também em relação as próprias substâncias que formam a vida na Terra.
Abs
raph
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