Indecência espiritual
 
Por agora encerrando as traduções dos poemas de Rumi em inglês... Há alguns poemas de Rumi que trazem metáforas “grosseiras”. De fato, tanto é assim, que os primeiros tradutores de tais poemas para o inglês, nos idos dos 1920s, preferiram manter tais passagens em latim, supondo que “quem quer que saiba ler em latim, terá refinamento suficiente para não se escandalizar”... Zoofilia! Os puritanos e os de mente em conserva iriam levá-lo a fogueira! Sorte de Rumi que sua poesia tem se irradiado somente entre os amantes, estes que sempre serão bem vindos a passear em sua Grande Carruagem...
[A importância  do artesanato de cabaças]
    
  Havia uma camareira
  que usou da inteligência para treinar um asno 
  ensinando-o a fazer o serviço de um amante.
De uma cabaça,
  ela esculpiu um engenhoso orifício
  de modo que encaixasse no pênis do animal,
  impedindo-o de penetrar muito profundamente nela.
Ela arquitetou sua cabaça de tal modo que a  penetração ia somente até o ponto máximo de seu prazer.
  E ela aproveitava seu brinquedo sempre que podia!
Ela entrou em êxtase, mas o asno começava a aparentar um pouco magro e um tanto cansado.
Sua patroa começou a suspeitar.
  Um dia ela espiou através de um buraco na porta
  e viu o espantoso membro do asno,
  e o deleite da garota
  esticada embaixo do animal.
Não disse nada. Mais tarde bateu na mesma porta
  e incumbiu a criada de uma tarefa,
  uma tarefa longa e complicada.
  Não entrarei em detalhes.
A camareira soube o que se passava, no entanto.
  “Ah, minha senhora,” ela pensou consigo mesma,
  “você não deveria ter mandado embora a  especialista.
Quando começa num caminho sem conhecimento total,
  você arrisca sua vida. Seu pudor lhe impede
  de me perguntar sobre a cabaça, mas ela é  necessária
  para que possa se unir a este asno.
  Há um truque que desconhece!”
Mas a mulher estava muito fascinada com a ideia
  para considerar qualquer perigo. Ela deixou o asno  entrar
  e trancou a porta, pensando, “Com ninguém em volta,
  poderei gritar de prazer.”
Ela estava desorientada
  pela ansiedade, sua vagina ardia
  e cantava como um rouxinol.
Ela arrumou a cadeira abaixo do asno,
  assim como viu a criada fazer. Ela levantou suas  pernas
  e o colocou dentro dela.
Seu fogo brilhou ainda mais,
  e o asno educadamente a estocou conforme ela o  instigou,
  seu membro entrou fundo e através de seu intestino,
  e, sem uma palavra, ela morreu.
A cadeira caiu para um lado,
  e ela pro outro.
O quarto estava manchado de sangue.
Leitor,
  alguma vez já viu alguém martirizado por um asno?
  Lembre o que o Corão diz sobre o tormento 
  de desgraçar-nos a nós mesmos.
Não sacrifique sua vida por sua alma animal!
Acaso morra pelo que ela lhe instigou a fazer,
  você será como a mulher morta no chão.
  A imagem da imoderação.
Lembre-se dela,
  e mantenha seu equilíbrio.
A criada retorna e diz, “Sim, você viu
  meu prazer, mas não percebeu a cabaça
  que colocava nele um limite. Você abriu
  sua loja antes que um mestre
  houvesse lhe ensinado a arte.”
***
[A grande carruagem]
Quando vejo sua face, as pedras começam a girar!
  Você aparece; todo o estudo vagueia.
  Eu perco meu lugar.
A água se torna perolada.
  O fogo aplaina e não mais destrói.
Em sua presença não desejo o que achei
  que desejava, essas três lamparinas suspensas.
Dentro de sua face os manuscritos antigos
  mais parecem espelhos enferrujados.
Você respira; surgem novas formas,
  E a música de um desejo mais conhecido
  que a Primavera começa seu ritmo
  como uma grande carruagem.
Conduza-a devagar.
  Alguns de nós caminhando ao seu lado
  são mancos!
***
Hoje, como qualquer outro dia, nós acordamos  desocupados
  e aflitos. Não abra a porta para o estudo.
  Guarde seu instrumento musical.
Deixe a beleza que amamos ser o que criamos.
  Existem centenas de maneiras de se ajoelhar e  beijar o chão.
***
Além das ideias de certo e errado,
  há um campo. Eu lhe encontrarei lá.
Quando a alma se deita naquela grama,
  o mundo está preenchido demais para que falemos  dele.
  Ideias, linguagem, e mesmo a frase “cada um”
  não fazem mais nenhum sentido.
***
A brisa matinal têm segredos a lhe contar.
  Não volte a dormir.
  Você precisa perguntar por aquilo que realmente  deseja.
  Não volte a dormir.
  As pessoas estão indo e vindo através da soleira  onde os dois mundos se tocam.
  A porta é arredondada e está aberta.
  Não volte a dormir.
***
Eu amaria lhe beijar agora.
    O  príncipe do beijo é sua vida.
Então meu amor está correndo em direção a minha  vida, gritando,
    Que  barganha, vamos comprar.
***
Luz matinal, cheia de pequenas partículas a dançar,
  e o grandioso a girar, nossas almas
  dançam contigo, sem pés, elas dançam.
  Você pode vê-las quando eu sussurro em seus  ouvidos?
***
Eles tentam dizer o que você é, espiritual ou  sexual?
  Eles especulam sobre Salomão e todas as suas  esposas.
No corpo do mundo, dizem, há uma alma,
  é isto o que você é.
Porém nós temos caminhos entre nós
  que nunca serão mencionados por ninguém.
***
Venha para o pomar na Primavera.
  Há luz e vinho, e namorados
  nas flores de romã.
Se você não vir, estes não farão diferença.
  Se você vir, estes não farão diferença.
(Poemas de Jalal ud-Din Rumi. Refletidos do inglês para o português por Rafael Arrais)
***
Crédito da foto: Atlantide Phototravel/Corbis
Marcadores: autores selecionados, autores selecionados (121-130), desejo, espiritualidade, poesia, poesia (91-100), Rumi, sufismo
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3 comentários:
To admirado aqui com a descrição perfeita de Gamaliel, o Asno Obsceno! Precisava ler isso, apesar de já não ter muito o que fazer. Há um preço por se acessar uma esfera e ele é se deparar com sua concha. Os espertos, antes de prosseguir, fazem sua preparação, sua "cabaça", de acordo com a arte, que é o equilíbrio dos elementos do arcano do Mundo, antes de se arriscar. Acessar Yesod, com suas imagens e toda a intensidade de seu psiquismo, que liga os mundos superiores ao inconsciente e estes a mente consciente para atingir o plano material, através das ações, tem seu preço. Voce nao acessa Yesod com frequencia sem que do inconsciente saltem reações automáticas, arquétipos sombrios e demais instintos, que devem ser conhecidos, mas reconciliados e equilibrados e para isso é fundamental um equilíbrio sólido e anterior dos 4 elementos. Quem se depara com o Asno despreparado e não morre, só tem uma saída para continuar vivo, o caminho da Arte, pois nela tem o equilíbrio dos 4 elementos do arcano do Mundo e tbm das forças de Yesod. Este é o grande problema da via solitária: O controle do monstro que emerge quando as imagens da casa do tesouro mostram toda sua poluição egoíca e seus instintos básicos de dominação e prazer, nosso Asno Obsceno... Sorte que para alguns há tempo de gritar e obter socorro.
Confesso que não fazia ideia que mesmo este asno do poema tinha um simbolismo oculto. É bem provável que Rumi tenha usado este símbolo em diversos outros poemas, sempre que menciona um asno geralmente está a falar de nossa alma animal... Mas talvez seja exatamente neste poema "obsceno" que ele tenha exposto de forma mais escancarada este símbolo :)
Como podemos ver, místicos de verdade sempre existiram, mas foram poucos e muito mal compreendidos. Ou se esforçaram para ser mal compreendidos, em alguns casos...
Conheço muito pouco do sufismo, mas creio que os sufistas e cabalistas usavam uma linguagem bem similar... Gamaliel me sautou aos olhos ao ler texto... obrigado pela luz!
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