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13.12.11

Nova Damanhur

Em 1992 a polícia italiana foi deslocada para o sopé do vale Valchiusella, 50Km ao norte de Turim, para investigar um possível crime de evasão fiscal de uma comunidade que ali vivia. Era já a segunda visita, e os policiais suspeitavam de que algo estava sendo construído no subterrâneo, sob o vale. Eles deram um ultimato: “Se não nos levarem até os túneis, vamos dinamitar toda a encosta até encontrar alguma coisa”.

Para os membros da comunidade, não restou outra alternativa que não levar os policiais até uma “porta secreta” num dos lados de uma casa da região... Uma vez aberta, aos polícias incrédulos revelou-se uma sala subterrânea de 8 metros de diâmetro suportada por colunas esculpidas e revestidas com folhas de ouro. As paredes estavam cobertas por pinturas de cores exuberantes; vitrais e uma imensa claraboia central derramavam luz multicolorida por todo o lado. Encontravam-se na Sala da Terra, apenas a primeira de um complexo arquitetônico de nove espaços que compõem Damanhur.

Tudo havia começado ainda na década de 60, quando Oberto Ariaudi, conhecido como Falco (Falcão), ainda criança começou a ter sonhos extremamente realistas de estranhos templos sagrados de civilizações há muito esquecidas, assim como de uma estrutura social bem distinta de nossa sociedade ocidental moderna. Seria apenas mais um dentre tantos casos de crianças que se lembram de vidas passadas (e, eventualmente, esquecem), não fosse pela persistência de Falco em tornar os seus sonhos realidade...

Com uma carreira consolidada de corretor de seguros, e mais 24 amigos e colaboradores que partilhavam de sua visão de uma nova sociedade, Falco fundou Damanhur, que na verdade é o nome de uma cidade do antigo Egito que existe até hoje [1], e começou a cavar... Cavar, cavar, e construir estruturas quase além da imaginação.

Quando foram descobertos, em 1992, pensaram que seria o fim: a primeira ordem das autoridades italianas foi para que tudo fosse parado até segunda ordem, já que se tratava de uma construção ilegal. Falco temeu que mandassem destruir tudo, mas então os governantes da região pensaram duas vezes, e perceberam que aquilo poderia auxiliar em muito a dinamização do turismo regional. Não só permitiram que Damanhur continuasse “de pé”, mas eventualmente foram liberados para continuar a construir mais e mais, para debaixo das montanhas de Valchiusella.

Hoje a Federação de Damanhur é um “experimento social para o futuro da humanidade”, e já conta com mais de mil moradores, dentre milhares de outros colaboradores que não vivem no local. Os Templos da Humanidade, como são chamados, comportam um complexo de templos interligados imenso e magnífico. São 300.000 m3 de salas e galerias de uma arquitetura grandiosa, interligadas em cinco níveis situados 30m abaixo da superfície, e profusamente decoradas com esculturas, pinturas, mosaicos e vitrais narrando à história da humanidade. Acima da terra, a comunidade já conta com sua própria universidade, escolas, mercados orgânicos, fazendas e casas ecológicas ganhadoras de prêmios.

Damanhur também têm sua própria constituição, que é revisada de tempos em tempos (atualmente é usada a de 2007), além de uma peculiar estrutura de “comunidades familiares” de 200 a 220 membros que se dedicam a uma atividade em particular. Tais atividades podem variar de pesquisas filosóficas e práticas espiritualistas até a pesquisa científica por novas soluções ecológicas, como o uso de energia eólica, por exemplo. Toda a estrutura da comunidade é dividida em 4 grandes “escolas”: a Escola de Meditação se fundamenta na tradição ritualística; A Escola Social se foca na realização da sociedade como um todo; O Jogo da Vida trata da parte dinâmica e em constante renovação da vida; Já a Tecnacarto, a mais recente, trata da realização individual e autoconhecimento.

Uma das máximas da constituição damanhuriana diz assim: “Da criação da tradição compartilhada, da cultura compartilhada, da história compartilhada, da ética compartilhada, as pessoas nascem”... E isso não ficou apenas na teoria, hoje Damanhur conta com a terceira geração de pessoas, ou seja: os netos dos primeiros damanhurianos que nasceram já dentro da comunidade, ainda na década de 70.

E pensar que no final do século 19 chegou-se a pensar que a religião e a espiritualidade entrariam em franco declínio, cedendo lugar a nova era da razão... Até mesmo ainda hoje, há muitos que creem que novas religiões não são formadas, e que toda a tradição religiosa remete a doutrinas milenares. De certa forma estão certos, pois uma seita recém criada só adquire o “status” de religião após aproximadamente um século, mas dito isso, o que não falta nessa verdadeira Nova Era são religiões e comunidades autossustentáveis surgindo a torto e a direito, seja aqui no Brasil, seja no Japão, seja nos Alpes italianos [2].

Você pode até achar irracional muitas das crenças de Nova Era, pode até achar confuso como tantas seitas diversas podem ter tantos pontos de crença em comum; Pode, sobretudo, achar absurdo que uma comunidade de mais de um milhar dedique suas vidas inteiras a construção do sonho de uma criança... Mas o que não poderá negar é o próprio assombro no olhar, ao constatar o que o sonho humano é capaz de construir – a Nova Damanhur.

Clique nas imagens abaixo para abrir em tamanho maior:

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Veja também:

» Tour vitual pelos Templos da Humanidade (clique nos Thumbnails ou no Mapa para ir avançando)

» Vídeo da Sala dos Espelhos (Hall of Mirros)

» Trailer do filme Sonhos de Damanhur (Dreams of Damanhur)

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[1] No antigo Egito a cidade era conhecida como Timinhor, "a cidade de Hórus". Na época ptolemaica a cidade era denominada Hermópolis Parva, para à distinguir de Hermópolis Magna, sendo a capital do 7º nomo do Baixo Egito (o nomo do "Arpão Ocidental"). Segundo o mito, o deus Toth seria oriundo deste local. Durante a Idade Média, a cidade tornou-se próspera devido a estar situada entre a rota de caravanas que passava entre o Cairo e Alexandria. Em 1302 foi destruída por um terremoto, mas foi restaurada pelo califa mameluco Barquq no final do século XIV. Segundo o próprio Falco, em uma de suas supostas vidas passadas ele teria vivido na antiga Damanhur. Outra curiosidade é que os Templos da Humanidade foram construídos em um dos locais da região em torno de Turim onde passa uma linha de Ley.

[2] Para um estudo elaborado do presente e futuro da espiritualidade humana, recomendo ler o livro “O futuro de Deus” (Bakas e Buwalda), publicado no país por A Girafa.

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Crédito das imagens: Divulgação (Tour virtual; Damanhur no Facebook; Artigo do Daily Mail)

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3 comentários:

Blogger Petri disse...

Uau, eu já tinha ouvido falar sobre Damanhur mas não sabia que era assim tão incrível (nem que ficava em Piedmont).

Parte da Nova Era?! Sabe, nunca gostei desse termo, o que diabos é a nova era? Por que eu só ouvia falar disso dentro de meios cristãos como sendo algo novo e mistérioso que tenta abalar seus preceitos tradicionais. Coisas como "o pentagrama é um simbolo perverso, é um simbolo da nova era" (criança ouve esse tipo de maluquice na catequese). Parece coisa de conspiracionista que acredita em um poder secreto invisivel coeso e unificado mundial a estebelecer uma nova ordem... seja como for estou saindo do foco.

Damanhur é uma iniciativa linda e ainda teremos mais dela pelo mundo.
Abraço

13/12/11 17:27  
Blogger raph disse...

Heh a Nova Era de certa forma é que nem a Física Quântica: se você acha que entendeu, é porque ainda não entendeu nada :)

Mas a definição da Wikipedia não está mal:

"O movimento da Nova Era (do inglês New Age) possui muitas subdivisões, sendo geralmente uma fusão de ensinos metafísicos de influência oriental, de linhas teológicas, de crenças espiritualistas, animistas e científicas, com uma proposta de um novo modelo de consciência moral, psicológica e social além de integração e simbiose com a Natureza e o Cosmos."

Abs
raph

14/12/11 09:39  
Blogger raph disse...

Susanna Queiroz, do programa No Caminho (Multishow), acabou de visitar Damanhur:

http://youtu.be/8OUzMgj0emI

29/8/12 18:20  

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