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30.6.09

O discurso da alma

Textos de Platão em "Fedro" (Editora Martins Claret, tradução de Alex Marins). As notas são de minha autoria.

SÓCRATES - Imagina que alguém expõe por escrito as regras de sua arte e um outro aceita o livro como sendo a expressão de sua doutrina clara e profunda; esse homem seria um tolo, pois, não entendendo a advertência profética de Amon [1], atribuiria a teorias escritas mais valor do que o de um simples lembrete do assunto tratado. Não é assim?

FEDRO - Perfeitamente.

S. - O uso da escrita, Fedro, tem um incoveniente que se assemelha à pintura. Também as figuras pintadas têm a atidude de pessoas vivas, mas se alguém as interrogar conservar-se-ão gravemente caladas. O mesmo sucede com os discursos. Falam das coisas como se as conhecessem, mas quando alguém quer informar-se sobre qualquer ponto do assunto exposto, eles se limitam a repetir sempre a mesma coisa [2]. Uma vez escrito, um discurso sai a vagar por toda parte, não só entre os conhecedores mas também entre os que o não entendem, e nunca se pode dizer para quem serve e para quem não serve [3]. Quando é desprezado ou injustamente censurado, necessita do auxílio do pai, pois não é capaz de defender-se nem de se proteger por si.

F. - Também neste ponto tens toda a razão.

S. - Examinemos agora uma outra espécie de discurso, irmão legítimo dessa eloquência bastarda: vejamos como nasce e quanto ele é superior e mais poderoso que o outro.

F. - A que discurso te referes, e como nasce ele?

S. - Refiro-me ao discurso conscienciosamente escrito com a ciência da alma, ao discurso que é capaz de defender a si mesmo e que sabe diante de quem convém falar e diante de quem é preferível ficar calado.

F. - Estás falando do discurso vivo e animado do homem sábio, do qual todo discurso escrito poderia ser chamado com justiça um simulacro?

S. - Exatamente. Imagina que um agricultor inteligente possua sementes e lhes dá valor, e das quais queira obter frutos. Pensaria tal homem seriamente em plantar suas sementes durante o verão nos jardins de Adônis [4], e gostaria de vê-las desenvolvidas como plantas dentro de oito dias? Seria possível que o fizesse de bom grado, mas simplesmente a título de cerimônia religiosa, por ocasião das festas de Adônis. Quanto às sementes a que deseja dar um fim sério, porém, ele as plantará em solo apropriado, utilizando a sua técnica de agricultor, e ficará contente se a seara lhe der frutos no oitavo mês.

F. - Mas é evidente, Sócrates; como dizes, esse homem faria uma coisa seriamente e a outra com intensões diversas.

S. - Ora, podemos nós dizer que quem possui o conhecimento do justo, do belo e do bom dará às suas sementes um uso menos judicioso do que o camponês?

F. - Não.

S. - Tu bem vês que aquele que conhece o justo, o bom e o verdadeiro não irá escrever na água (locução que equivale a escrever na areia) essas coisas, nem usará uma caniço para semear tais discursos, pois eles se mostrarão incapazes de ensinar eficientemente a verdade.

F. - Provavelmente não fará isso.

S. - Claro que não. Naturalmente, semeará nos jardins literários apenas por passatempo. Se escrever, será na intenção de acumular para si mesmo um tesouro de recordações para a velhice, se chegar até lá; porque os velhos esquecem tudo. Escreverá também para os que caminham na mesma rua com ele, e se alegrará vendo crescer as tenras plantas. E, enquanto outros se divertem em banquetes e prezeres semelhantes, esse homem se recreará com as coisas que mencionei [5].

F. - Mas, Sócrates, estás comparando com divertimentos vulgares a belíssima atividade de um homem que se deleita em escrever discursos sobre a justiça e as outras virtudes!

S. - É verdade, meu caro Fedro! Mas acho muito mais bela a discussão dessas coisas quando alguém semeia palavras de acordo com a arte dialética, depois de ter encontrado uma alma digna para recebê-las; quando esse alguém planta discursos que são frutos da razão, que são capazes de defender por si mesmos e ao seu cultivador, discursos que não são estéreis mas que contém dentro de si sementes que produzem outras sementes em outras almas, permitindo assim que elas se tornem imortais. Aos que as levam consigo, tais sementes proporcionam a maior felicidade que é dado ao homem possuir [6].

F. - Na verdade, isso é muito mais belo.

***

[1] Sócrates acabara de descrever o mito da invenção da escrita pelo deus egípcio Thoth. Este foi repreendido em sua intenção por outro deus egípcio, Amon: "Tu, como pai da escrita, esperas dela com o teu entusiasmo precisamente o contrário do que ela pode fazer. Tal coisa tornará os homens esquecidos, pois deixarão de cultivar a memória; confiando apenas nos livros escritos, só se lembrarão de um assunto exteriormente e por meio de sinais, e não em si mesmos. Logo, tu não inventaste um auxiliar para a memória, mas apenas para a recordação. Transmites aos teus alunos uma aparência de sabedoria, e não a verdade, pois eles recebem muitas informações sem instrução e se consideram homens de grande saber, embora sejam ignorantes na maior parte dos assuntos. Em consequência, serão desagradáveis companheiros, tornar-se-ão sábios imaginários ao invés de verdadeiros sábios".
Sócrates (assim como seu discípulo, Platão) acreditava que a sabedoria não poderia ser passada adiante como "verdades impressas" em algum texto ou discurso, mas que deveria ser despertada na alma das pessoas; até mesmo porque certas verdades não podem ser expressas em palavras, mas somente através da estimulação do logos (razão conectada ao Cosmos) de cada um. No belo final do "Fedro", Sócrates nos dá uma boa pista de como discursar para a alma - é exatamente este trecho que está transcrito acima.

[2] Infelizmente Sócrates não viveu em nossa época, pois ficaria maravilhado com as possibilidades de discursos transmitidos em blogs e afins, onde todos podem comentar e interagir diretamente com o autor, contanto que este realmente frequente o próprio blog. Muito embora, evidentemente, nossa sociedade em sua maioria continue utilizando a web para fins muito menos nobres...

[3] Os discursos não poderem se adaptar a sua audiência. Sócrates defendia que, pessoalmente, o filósofo deveria ser capaz da analisar o conhecimento de cada um, e proferir discursos de acordo com a capacidade de cada ouvinte. Talvez mesmo por isso nunca tenha escrito coisa alguma, tendo sempre preferido transmitir sua sabedoria pessoalmente aos seus discípulos.

[4] Tratava-se de uma festa para o deus Adônis. No início da festa colocavam-se sementes em grandes vazos cheios de terra molhada, para simbolizar o desaparecimento de Adônis; depois expunham-se os vasos à irradiação de um forte calor artificial, o que fazia com que as sementes brotassem em poucos dias. As pequenas plantas que se desenvolviam nos jardins de Adônis eram apresentadas no fim da festa como símbolos da ressurreição desse deus. Naturalmente, tais plantas artificiais eram bonitas, mas caducavam poucos dias depois da festa, sem dar frutos nem sementes. Ou seja, o camponês sábio guardava suas melhores sementes não para a festa, mas para o plantio durável, para que possam germinar e dar frutos reais. Esta é mais uma bela analogia de Sócrates para com o discurso efêmero (atrativo e superficial, mas que não dá frutos) e o discurso durável, talhado para a alma (requer certa reflexão, mas traz o fruto como recompensa).

[5] Sócrates dedicou boa parte da vida a analisar a sabedoria dos homens. E percebeu que exatamente os que se julgavam os mais sábios eram, muitas das vezes, os mais ignorantes. Por isso se utiliza de uma fina ironia em muitas de suas críticas veladas a sociedade da época. Também é preciso lembrar que é muito complexo discernir o que era pensamento genuíno de Sócrates, e o que era interferência de Platão, nessas questões.

[6] Em última instância, a função da filosofia é proporcionar ao homem o contato com tal felicidade. Após o contato, todo filósofo pleno dessa felicidade não terá objetivo mais recompensador do que o de passar tal conhecimento adiante, de modo a que outros também possam alcançar a felicidade. Se há "filósofos" que não fazem isso, é porque nunca alcançaram essa sabedoria, e não exatamente porque creem que a filosofia deva ser uma forma de sofrimento intelectual, ou um conjunto de sistemas e regras do pensar, que servem mais para confundir a mente do que aplainá-la.

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Crédito da foto: camerar (borboleta "adonis blue - lysandra bellargus")

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29.6.09

A Carruagem

Existe uma carruagem etérea que tem singrado o universo
Desde que a primeira fagulha surgiu na escuridão
E a sublime canção tem sido cantada em verso
Tanto acima quanto abaixo, em todas as esferas
Como o vento que sopra onde quer na imensidão
Como a inspiração de todo poeta, e a dúvida de todo sábio
Através desse turbilhão de eras

Existe uma linguagem para se referir a tal automóvel
Dizemos que é o símbolo, nossa própria representação
A arrastar a roda pelos velhos sulcos de barro
Pelo mesmo caminho interminável que percorreram nossos irmãos
Sejam jovens ou velhos: não existe idade exata para um carro
Que luta a tantas vidas contra o tempo, ao desgaste das mãos
Sangrando na tentativa de mover o que é imóvel

Existe uma direção para a qual todos empurram sua alma
Mas nem todos souberam encontrar o melhor caminho
E há muitos que encalharam em vielas estreitas
Onde não encontram saída alguma, nem são mais capazes
De enxergar a luz dos anciãos que vêm à margem
Em seus carros confortáveis onde as rodas giram com alinho
No mesmo ritmo das canções vorazes

Existe uma carruagem etérea que tem singrado o universo
Suas rodas giram, e o tempo escorre pelas mãos
Como que num piscar de olhos, galáxias e mundos
E seres infinitos, se formam na imensidão
Mas para quem compreende o verdadeiro motor
A mover o que não se vê através dos dias dos homens
O mistério é desvelado, e a paz da alma se une a razão

Tudo o que somos é poeira estelar, é resto de barro
Levantado por condutores trêmulos em carros sem direção
Com a vista turva, mas com seu coração em comunhão
Querendo sempre retornar,
(tão somente retornar)
Ao seu único e verdadeiro lar...

raph'09

***

A inspiração para esse poema me surgiu subitamente durante a leitura do artigo: "A corrupção moderna da magia", de autoria de "Prophecy" e publicado no blog do Marcelo Del Debbio. Como usual, não faço idéia do que exatamente esse poema tem a ver com o artigo...

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Crédito da foto: Nei Lima

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28.6.09

Os Aymara e o tempo

Os índios Aymara, que habitam há séculos as margens do lago Titicaca, nos Andes, junto com algumas tribos africanas tem um estranho conceito de passado e futuro.

Exatamente ao contrario de nós, o que para nós é passado, para eles é futuro e, com esse conceito defendem a necessidade de sete diferentes tipos de paz.

A primeira é para dentro de si. Consigo próprio, na saúde do corpo, na lucidez da mente, no prazer do seu trabalho, na correspondência dos seus amores. Sem paz consigo, você não está em paz.

A segunda é para cima. Com o espírito de seus antepassados, com a vontade de Deus. Se você não está em paz com o mundo espiritual, com a essência de sua existência, sua paz está incompleta.

A terceira paz é para frente, com seu passado. A cultura ocidental põe o passado para trás. Já os Aymara põem o passado à frente, porque ele é o conhecido, o visto, o vivido. Se você tem remorsos, dívidas não pagas, culpas, arrependimentos, não está totalmente em paz.

A quarta paz é para trás, com seu futuro. Quem tem medo do que virá, está assustado com dívidas a pagar, com emprego incerto, esperando más notícias, não está em paz.

A quinta é para o lado esquerdo, com seus próximos. Sem a paz familiar, não há paz. A disputa doméstica, o descontentamento com familiares e amigos próximos, tira o sentimento de paz.

A sexta paz é para o lado direito, com seus vizinhos. Não adianta a paz em casa, se do outro lado da rua estão a ameaça, a maldição, o descontentamento.

A sétima paz é para baixo, com a terra que você pisa, de onde virá seu sustento. Se vier tempestade, se o solo secar ou tremer, se não respeitarmos nosso planeta, não haverá paz completa.

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Crédito da foto: José Branco

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26.6.09

Todo o Cosmos de Sagan

A série Cosmos é um dos mais formidáveis exemplos da amplitude e eficácia que a divulgação científica pode atingir por meios audiovisuais, quando servida por uma personalidade carismática como Carl Sagan e por meios técnicos adequados. Filmado ao longo de três anos, em quarenta locais de doze países, o programa Cosmos abriu a janela do Universo a mais de 500 milhões de pessoas. O segredo desta série de treze horas foi o talento de comunicador de Sagan, capaz de desmitificar o que até então fora informação científica inacessível. A versão escrita deste programa continua a ser o livro de divulgação científica mais vendido da história.

Como no Brasil estão esgotados os DVDs da série (lançados pela Editora Abril), o jeito é recorrer a própria web. Infelizmente esses videos costumam ser retirados do ar de tempos em tempos, tentarei manter os links atualizados na medida do possível:

Episódio 1: Os Limites do Oceano Cósmico [ver este episódio]
Partindo dos limites do grande oceano espacial, Carl Sagan embarca numa imensa viagem cósmica que começa a 8 bilhões de anos-luz da Terra. A bordo da nave espacial da sua imaginação, ele transporta-nos às maravilhas do Cosmos: quasares, galáxias em espiral, nebulosas, supernovas e pulsares. Penetrando nas nuvens da Terra, encontramo-nos no Egito, onde Eratóstenes pela primeira vez mediu a Terra. A Biblioteca de Alexandria, berço da aprendizagem da Antiguidade, ressuscita em toda a sua glória - para ilustrar a fragilidade do conhecimento. É então que, para nos fazer compreender a enormidade do tempo que passou desde o Big bang até hoje, Sagan nos apresenta o "Calendário Cósmico".

Episódio 2: Uma Voz na Sinfonia Cósmica [ver este episódio]
Como começou a vida na Terra? Há outros seres vivos em outros mundos? Carl Sagan explora a origem, evolução e diversidade da vida na terra. Com uma espantosa animação computadorizada, entramos no coração de uma célula viva para lhe examinarmos a molécula da vida: o DNA. Vamos assistir a experiências laboratoriais que nos darão idéia dos primeiros passos que conduziram à origem da vida. Seqüências animadas espetaculares acompanham a evolução humana a partir de organismos unicelulares que existiam nos oceanos. E, finalmente, conheceremos as diferentes formas de vida que poderiam habitar uma atmosfera como a do planeta Júpiter, os "caçadores", "flutuadores" e "mergulhadores".

Episódio 3: A Harmonia dos Mundos [ver este episódio]
Em todo o mundo, os nossos antepassados de todas as culturas tiveram conhecimentos próprios de astronomia. As suas vidas disso muito dependiam. O último astrólogo científico foi também o primeiro astrônomo moderno: Johannes Kepler. Kepler lutou pela busca de uma harmonia nos céus e deu um passo fundamental para nos conduzir à era científica. O segredo que conduziu Kepler foi um respeito descomprometido pela observação dos céus, mesmo quando, agonizante, o confrontaram com as mais enraizadas crenças que acarinhava. Os profundos conhecimentos de Kepler ensinaram-nos como a Lua e os planetas se movem nas respectivas órbitas e, mais recentemente, como viajar para eles.

Episódio 4: Céu e Inferno [ver este episódio]
Em 1908, na Sibéria, uma explosão misteriosa abalou a paisagem, projetando árvores a milhares de quilômetros de distância e produzindo um som que se ouviu em todo o mundo. Teria uma nave espacial extraterrestre sofrido um acidente nuclear? Carl Sagan examina os testemunhos e conclui que a Terra foi atingida por um pequeno cometa. Um modelo do sistema solar demonstra a possibilidade de outros planetas terem sofrido impactos semelhantes. Embarcamos numa viagem descendente através da atmosfera infernal de Vênus, para explorar a superfície de braseira, atingida esta pelo chamado efeito de estufa. O destino de Vênus pode ser uma história de alerta para o nosso mundo.

Episódio 5: O Blues do Planeta Vermelho [ver este episódio]
O planeta Marte vem fascinando os humanos há séculos, tanto na ficção científica quanto na ciência real. Carl Sagan nos conduz ao Observatório Percival Lowell, construído no Arizona, para estudar os "canais" de Marte, que Lowell acredita terem sido construídos por uma civilização extinta. Há alguns anos, duas espaçonaves Vikings pousaram em Marte. Explorando a superfície do planeta vermelho, Viking não achou nenhuma indicação, nenhum artefato, ou qualquer tipo de vida inteligente. Mas a possibilidade de vida microscópica, passada ou presente, ainda permanece em discussão. Segundo os estudos realizados, se já houve vida em Marte, ela desapareceu...

Episódio 6: A Saga dos Viajantes [ver este episódio]
Há trezentos anos a Holanda começou a enviar seus navios mundo afora recolhendo dados sobre nosso planeta; hoje espaçonaves já navegam para todos os planetas conhecidos de nossos ancestrais. Carl Sagan leva-nos ao Laboratório de Propulsão a Jato para compararmos a empolgante viagem exploratória a bordo de um navio com a emocionante experiência dos cientistas que presenciaram as primeiras imagens das luas de Júpiter, tomadas pela espaçonave Voyager. A espaçonave da imaginação segue a trilha da Voyager levando-nos aos anéis de Saturno e a seu satélite Titã, cuja atmosfera é rica em material orgânico. E após explorar o sistema solar, a nave Voyager continuará cruzando para sempre o grande oceano interestelar.

Episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite [ver este episódio]
O que são as estrelas? Tempos houve em que os humanos curiosos imaginaram que as estrelas eram fogueiras no céu, mantidas acesas por magia, ou pensaram que a Via Láctea era a "Coluna Vertebral da Noite". Há 2300 anos, na ilha grega de Samos, um homem de nome Aristarcos sugeriu que era o Sol e não a Terra que estava no centro do sistema solar. Ele foi o culminar duma tradição com 200 anos, agora amplamente esquecida, segundo a qual leis naturais e não deuses caprichosos regiam o universo. Na caverna de Pitágoras, em Samos, Carl Sagan descobre também um lado diverso do pensamento grego, o mundo místico guardado por uma irmandade erudita que trabalhava para ocultar do povo o conhecimento que possuía. O tema deste episódio é o nascimento do pensamento científico na nossa civilização e em nós mesmos.

Episódio 8: Viagens no Espaço e no Tempo [ver este episódio]
Há mais estrelas no Cosmos que grãos de areia em todas as praias da Terra. Se conseguíssemos observar os céus durante milhões de anos, as constelações mudariam de forma conforme as estrelas que as compõem se movem e evoluem. Numa máquina do tempo, exploramos o que sucederia se pudesse alterar o passado. Viajamos até aos planetas de outras estrelas. Refazemos o sonho de adolescente de Albert Einstein de viajar num feixe de luz; a sua teoria da relatividade prevê que cerca da velocidade da luz produziria estranhos efeitos, mas daria aos exploradores espaciais a possibilidade de, numa só vida, irem até ao centro da galáxia. Voltariam, contudo, a uma Terra muito mais velha do que aquela de onde haviam partido.

Episódio 9: As Vidas das Estrelas [ver este episódio]
A maioria dos átomos dos nossos corpos foram feitos no interior das estrelas. "Somos matéria estelar". Com animação computadorizada e espantosa arte astronômica, nôs é mostrado como as estrelas nascem, vivem e morrem. Carl Sagan persegue a origem e a natureza dos buracos negros, objetos com uma gravidade de tal ordem que a luz não consegue sair deles. Testemunhamos a explosão de estrelas distantes que produzem raios cósmicos que provocam mutações nos seres da Terra. No sentido mais profundo, a origem, evolução e destino da vida do nosso planeta estão relacionados com a evolução do Cosmos.

Episódio 10: O Limiar da Eternidade [ver este episódio]
Qual é a origem do universo? Qual é o seu destino? Continuará a expandir-se para sempre ou sofrerá um dia um colapso? Carl Sagan explora o tempo em que as estrelas e galáxias se começaram a formar, e mostra como neste século os seres humanos descobriram a expansão do Universo. Vamos até à Índia onde uma velha cerimônia comemora os ciclos da Natureza. Tal como os modernos astrofísicos, a mitologia Hindu fala de um universo velho de bilhões de anos e da possibilidade de ciclos eternos de morte e renascimento. São explorados mundos de duas e quatro dimensões antes do Dr. Sagan desaparecer num buraco negro. Os astrônomos conjecturam qual o destino que aguarda o Cosmos: expansão eterna sem limites ou oscilação sem fim.

Episódio 11: A Persistência da Memória [ver este episódio]
O cérebro humano é ponto de embarque de todas as nossas viagens cósmicas. É um repositório de informação, como são os genes que evoluíram muito mais cedo e os livros que despontaram muito mais tarde. Carl Sagan leva-nos a bordo de um navio de pesquisa oceânica para examinarmos uma das outras espécies inteligentes que conosco partilham o planeta... as grandes baleias. Ele nos mostra depois a uma caminhada pelo cérebro humano para que testemunhemos a arquitetura do pensamento. O Dr. Sagan penetra na "Biblioteca cerebral", onde estão armazenados trilhões de bits de informação. Um pouco da informação existente nos nossos genes, nos nossos cérebros e nas nossas bibliotecas, foi lançado a bordo da nave espacial interestelar Voyager... Uma mensagem dentro de uma garrafa, dirigida a seres de outras épocas e de outros mundos.

Episódio 12: Enciclopédia Galáctica [ver este episódio]
Carl Sagan examina os relatos persistentes de visitantes extraterrestres à Terra e argumenta que não se encontram, entre todas as histórias de UFOs, Não há alguma prova física convincente. Numa recriação da decifração da pedra da Rosetta, ele conduz-nos ao Egito, onde Jean François Champollion foi pioneiro na decodificação das mensagens hieroglíficas deixadas por uma antiga civilização. A "Pedra da Rosetta" da comunicação interestelar, argumenta ele, é a própria ciência. O maior radiotelescópio do mundo está permanentemente capaz de receber mensagens radio enviadas por civilizações estranhas de qualquer ponto da Via Láctea.

Episódio 13 (Último): Quem Pode Salvar A Terra? [ver este episódio]
Este episódio é a histórica declaração televisiva que refere a necessidade urgente de uma perspectiva planetária para enfrentar a loucura da corrida aos armamentos nucleares.
No passado, guerreamo-nos uns aos outros, raramente apreciando as semelhanças de todas as culturas e povos da Terra. Mas agora o mundo encontra-se no meio de uma devastadora revolução de nível mundial, conforme se vai encaminhando para uma única comunidade global. Ao mesmo tempo, as máquinas de destruição tornaram-se capazes de arrasar a nossa civilização, e talvez, até mesmo a nossa espécie. A promessa de uma grande civilização científica já foi uma vez destruída pela ignorância e pelo medo, quando no séc. V uma multidão de fanáticos destruiu por completo a grande Biblioteca de Alexandria. O Dr. Sagan argumenta que a nossa sobrevivência não se deve apenas a nós próprios, aos nossos antepassados, ou aos nossos descendentes, mas também a esse Cosmos, antigo e enorme, do qual despontamos.


Obs: Os vídeos costumam sair do ar de tempos em tempos, por questões de copyright. Tento manter todos os links atualizados, mas ultimamente tem sido difícil achar os vídeos disponíveis no YouTube ou Vimeo...

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Crédito da imagem: carlsagan.com

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A graça de ser só

Autor: Pe. Fábio de Melo

Ando pensando no valor de ser só. Talvez seja por causa da grande polêmica que envolveu a vida celibatária nos últimos dias. Interessante como as pessoas ficam querendo arrumar esposas para os padres. Lutam, mesmo que não as tenhamos convocado para tal, para que recebamos o direito de nos casar e constituir família.

Já presenciei discursos inflamados de pessoas que acham um absurdo o fato de padre não poder casar.

Eu também fico indignado, mas de outro modo. Fico indignado quando a sociedade interpreta a vida celibatária como mera restrição da vida sexual. Fico indignado quando vejo as pessoas se perderem em argumentos rasos, limitando uma questão tão complexa ao contexto do "pode ou não pode".

A sexualidade é apenas um detalhe da questão. Castidade é muito mais. Castidade é um elemento que favorece a solidão frutuosa, pois nos coloca diante da possibilidade de fazer da vida uma experiência de doação plena. Digo por mim. Eu não poderia ser um homem casado e levar a vida que levo. Não poderia privar os meus filhos de minha presença para fazer as escolhas que faço. O fato de não me casar não me priva do amor. Eu o descubro de outros modos. Tenho diante de mim a possibilidade de ser dos que precisam de minha presença. Na palavra que digo, na música que canto e no gesto que realizo, o todo de minha condição humana está colocado. É o que tento viver. É o que acredito ser o certo.

Nunca encarei o celibato como restrição. Esta opção de vida não me foi imposta. Ninguém me obrigou ser padre, e quando escolhi o ser, ninguém me enganou. Eu assumi livremente todas as possibilidades do meu ministério, mas também todos os limites. Não há escolhas humanas que só nos trarão possibilidades. Tudo é tecido a partir dos avessos e dos direitos. É questão de maturidade.

Eu não sou um homem solitário, apenas escolhi ser só. Não vivo lamentando o fato de não me casar. Ao contrário, sou muito feliz sendo quem eu sou e fazendo o que faço. Tenho meus limites, minhas lutas cotidianas para manter a minha fidelidade, mas não faço desta luta uma experiência de lamento. Já caí inúmeras vezes ao longo de minha vida. Não tenho medo das minhas quedas. Elas me humanizaram e me ajudaram a compreender o significado da misericórdia. Eu não sou teórico. Vivo na carne a necessidade de estar em Deus para que minhas esperanças continuem vivas. Eu não sou por acaso. Sou fruto de um processo histórico que me faz perceber as pessoas que posso trazer para dentro do meu coração. Deus me mostra. Ele me indica, por meio de minha sensibilidade, quais são as pessoas que poderão oferecer algum risco para minha castidade. Eu não me refiro somente ao perigo da sexualidade. Eu me refiro também às pessoas que querem me transformar em "propriedade privada". Querem depositar sobre mim o seu universo de carências e necessidades, iludidas de que eu sou o redentor de suas vidas.

Contra a castidade de um padre se peca de diversas formas. É preciso pensar sobre isso. Não se trata de casar ou não. Casamento não resolve os problemas do mundo.

Nem sempre o casamento acaba com a solidão. Vejo casais em locais públicos em profundo estado de solidão. Não trocam palavras, nem olhares. Não descobriram a beleza dos detalhes que a castidade sugere. Fizeram sexo demais, mas amaram de menos. Faltou castidade, encontro frutuoso, amor que não carece de sexo o tempo todo, porque sobrevive de outras formas de carinho.

É por isso que eu continuo aqui, lutando pelo direito de ser só, sem que isso pareça neurose ou imposição que alguém me fez. Da mesma forma que eu continuo lutando para que os casais descubram que o casamento também não é uma imposição. Só se casa aquele que quer. Por isso perguntamos sempre – É de livre e espontânea vontade que o fazeis? – É simples. Castos ou casados, ninguém está livre das obrigações do amor. A fidelidade é o rosto mais sincero de nossas predileções.

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Crédito da foto: Revista Isto É

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24.6.09

A linguagem e o cérebro

No video abaixo, o neurocientista Michael Merzenich fala sobre um incrível poder do cérebro: sua habilidade de se reconectar de maneira ativa. Ele estuda maneiras de aproveitar a plasticidade cerebral para melhorar nossas habilidades e recuperar funções perdidas.

Merzenich também explica como a linguagem exerce papel primordial no desenvolvimento da plasticidade cerebral, ainda desde os primeiros meses de idade - de longe os mais importantes para nossa vida. Nós nos preocupamos por anos e anos com nossa saúde física, mas a neurologia nos demonstra que a saúde mental pode ser muito mais importante...

Para ver com legendas em português: clicar no link "view subtitles" e selecionar "portuguese (brazil)" na lista.

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Artigo relacionado (em inglês):

» Como nossa linguagem molda o nosso modo de pensar, por Lera Boroditsky

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O verdadeiro Eu

Autor: Alan Moore.
Fonte: Acid (em artigo para o site Somos Todos Um, o texto é retirado do documentário "The Mindscape of Alan Moore").

Quando cumprimos a vontade de nosso verdadeiro Eu, nós estamos inevitavelmente cumprindo com a vontade do universo. Na magia, ambas as coisas são indistinguíveis. Cada alma humana não é, de fato, UMA alma humana: é a alma do universo inteiro. E, enquanto você cumprir a vontade do universo, é impossível fazer qualquer coisa errada.

Muitos dos magos como eu entendem que a tradição mágica ocidental é uma busca do Eu com "E" maiúsculo. Esse conhecimento vem da Grande Obra, do ouro que os alquimistas buscavam, a busca da Vontade, da Alma, a coisa que temos dentro que está por trás do intelecto, do corpo e dos sonhos. Nosso dínamo interior, se preferir assim. Agora, esta é, particularmente, a coisa mais importante que podemos obter: o conhecimento do verdadeiro Eu.

Assim, parece haver uma quantidade assustadora de pessoas que não apenas têm urgência por ignorar seu Eu, mas que também parecem ter a urgência por obliterarem-se a si próprias. Isto é horrível, mas ao menos vocês podem entender o desejo de simplesmente desaparecer, com essa consciência, porque é muita responsabilidade realmente possuir tal coisa como uma alma, algo tão precioso. O que acontece se a quebra? O que acontece se a perde? Não seria melhor anestesiá-la, acalmá-la, destruí-la, para não viver com a dor de lutar por ela e tentar mantê-la pura. Creio que é por isso que as pessoas mergulham no álcool, nas drogas, na televisão, em qualquer dos vícios que a cultura nos faz engolir, e pode ser vista como uma tentativa deliberada de destruir qualquer conexão entre nós e a responsabilidade de aceitar e possuir um Eu superior, e então ter que mantê-lo.

Tenho estudado a escola da história do pensamento mágico e o ponto em que começou a dar errado. No meu entender, o ponto em que começa a dar errado é com o monoteísmo. Quero dizer, se olhar a história da magia, verá suas origens nas cavernas, verá suas origens no Xamanismo, no Animismo, na crença de que tudo o que te rodeia, cada árvore, cada rocha, cada animal foi habitado por algum tipo de essência, um tipo de espírito com o qual talvez possamos nos comunicar. E ao centro você tinha um xamã, um visionário, que seria o responsável por canalizar as idéias úteis para a sobrevivência. No momento em que você chega às civilizações clássicas, verá que tudo isto foi formalizado até certo grau. O xamã atuava puramente como um intermediário entre os espíritos e as pessoas. Sua posição na aldeia ou comunidade, imagino, era a de um "encanador espiritual". Cada pessoa no grupo devia ter seu papel: A melhor pessoa durante uma caçada tornava-se o caçador, a pessoa que era melhor pra falar com os espíritos, talvez porque ele ou ela estivesse um pouco louco, um pouco separado do nosso mundo material normal, eles tornavam-se os xamãs. Eles não seriam mestres de uma arte secreta, mas sim, os que simplesmente espalhariam sua informação pela comunidade, porque se acreditava que isto era útil para todo o grupo. Quando vemos o surgimento das culturas clássicas, tudo isso se formalizou para que houvesse panteões de deuses, e cada um destes deuses tinha uma casta de sacerdotes, que até certo ponto atuariam como intermediários, que te instruiriam na adoração a estes deuses. Então, a relação entre os homens e seus deuses, que pode ser vista como a relação entre os humanos e seus "Eus" superiores, não era todavia de um modo direto.

Quando chega o Cristianismo, quando chega o Monoteísmo, de repente tem uma casta sacerdotal movendo-se entre o adorador e o objeto de adoração. Tem uma casta sacerdotal convertendo-se em uma espécie de gerência intermediária entre a humanidade e a divindade que está se buscando. Já não se tem mais uma relação direta com os deuses. Os sacerdotes não têm necessariamente uma relação com Deus. Eles só têm um livro que fala sobre gente que viveu há muito tempo que teve relação direta com a divindade. E assim está bom: Não é preciso ter visões milagrosas, não é preciso ter deuses falando contigo. Na verdade, se você tem algo disto, provavelmente está louco. No mundo moderno, essas coisas não acontecem; as únicas pessoas as quais se permite falar com os deuses, e de um modo unilateral, são os sacerdotes. E o Monoteísmo é, pra mim, uma grande simplificação. Eu quero dizer, a Cabala tem uma grande variedade de deuses, mas acima da escala, da Árvore da Vida, há uma esfera que é o Deus Absoluto, a Mônada. Algo que é indivisível, você sabe. E todos os outros deuses, e, de fato, tudo mais no universo é um tipo de emanação daquele Deus. E isto está bem. Mas, quando você sugere que lá está somente esse único Deus, a uma altura inalcançável acima da humanidade, e que não há nada no meio, você está limitando e simplificando o assunto.

Eu tendo a pensar o Paganismo como um tipo de alfabeto, de linguagem. É como se todos os deuses fossem letras dessa linguagem. Elas expressam nuances, sombras de uma espécie de significado ou certa sutileza de idéias, enquanto o Monoteísmo é só uma vogal, onde tudo está reduzido a uma simples nota, que quem a emite nem sequer a entende.

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Crédito da foto: Rodrigo Furlan (Alan Moore)

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Placebo-Nocebo

Hipócrates, pai da medicina, dedicou sua vida ao estudo de formas racionais para o tratamento de doenças. Era avesso a superstição e as práticas de "barganha" com os deuses em busca de curas milagrosas. Dizia que "tudo acontece conforme a natureza", a cura "está ligada ao tempo e às vezes também às circunstâncias", e por isso mesmo nenhum médico poderia prometer cura, e sim tratamento: "Tuas forças naturais, as que estão dentro de ti, serão as que curarão suas doenças".

A medicina moderna, no entanto, parece ter a tendência a analisar o corpo como uma máquina. Fascinados pelos avanços da tecnologia, talvez tais médicos pensem que a maquinaria avançada possa fazer todo diagnóstico e tratamento quase que no "piloto automático", e que eles devem tão somente estar muito bem informados acerca das últimas descobertas das ciências médicas... Acupuntura? Homeopatia? Medicina-alternativa? Relação amorosa entre médico e paciente? Tudo isso se resume a pseudociências que não tem quase nenhum efeito no tratamento como um todo. Os poucos que admitem algum efeito, o colocam na conta do fenômeno placebo-nocebo.

Em qualquer tratamento farmacológico, os efeitos terapêuticos relacionam-se a dois tipos de fatores: específicos (dose, duração, via de administração, farmacodinâmica, farmacocinética, interações medicamentosas, etc.) e não específicos (história e evolução natural da doença, regressão à média, aspectos sócioambientais, variabilidade inter e intraindividual, desejo de melhora, expectativas e crenças no tratamento, relação médico-paciente, características não-farmacológicas do medicamento, etc). O fenômeno placebo-nocebo faz parte destes últimos.

Etimologicamente, o termo placebo se origina do latim placeo, placere, que significa agradar, enquanto o termo nocebo se origina do latim nocere, que significa inflingir dano. De forma generalizada, entende-se efeito ou resposta placebo como a melhoria dos sintomas e/ou funções fisiológicas do organismo em resposta a fatores supostamente inespecíficos e aparentemente inertes (sugestão verbal ou visual, comprimidos inertes, injeção de soro fisiológico, cirurgia fictícia, etc.), sendo atribuível, comumente, ao simbolismo que o tratamento exerce na expectativa positiva do paciente.

Para muitos céticos, basta taxar toda melhora ou cura efetiva conseguida através de tratamentos da medicina-alternativa como efeito placebo (como é mais conhecido o fenômeno) para se livrarem, como que num piscar de olhos, do problema de ter de explicar tais fenômenos fora do âmbito científico tradicional. Ora, mas não basta apenas classifica-los como placebo, é preciso compreender o que exatamente é o fenômeno em si. Do contrário, ficará parecendo, para quem tem a compreensão um pouco mais profunda, que os céticos estão apenas afirmando algo como: "Não fazemos a menor idéia de como isso ocorre, mas é um efeito que chamamos de placebo, e por enquanto basta-nos saber disso." - Ou seja, é a mesma coisa que não afirmar objetivamente nada.

Felizmente, também há céticos que se aprofundam um pouco mais no problema: "Médicos em um estudo eliminaram verrugas com sucesso, pintando-as com uma tinta colorida e inerte, e prometendo aos pacientes que as verrugas desapareceriam quando a cor se desgastasse. Em um estudo de asmáticos, pesquisadores descobriram que podiam produzir a dilatação das vias aéreas simplesmente dizendo às pessoas que elas estavam inalando um broncodilatador, mesmo quando não estavam. Pacientes sofrendo dores após a extração dos dentes sisos tiveram exatamente tanto alívio com uma falsa aplicação de ultrassom quanto com uma verdadeira, quando tanto o paciente quanto o terapeuta pensavam que a máquina estava ligada. Cinqüenta e dois por cento dos pacientes com colite tratados com placebos em 11 diferentes testes, relataram sentir-se melhor -- e 50 por cento dos intestinos inflamados realmente pareciam melhores quando avaliados com um sigmoidoscópio." - Tudo isso foi retirado de um artigo cético sobre o assunto.

Um dos maiores placebos da história é aquele que diz que a vitamina C evita resfriados. Quem não toma vitamina C para evitar resfriados? Quem não conhece alguém que toma? No entanto, tudo indica que qualquer melhora nesse sentido é causada muito mais por nossa crença na melhora do que por algum fator químico da própria vitamina C. Então, após todos esses anos, será que ninguém parou para se perguntar: "Então se a vitamina C não trata a gripe comum, o que diabos trata?"

Não sabemos exatamente como o fenômeno funciona, mas temos quase certeza que seu mecanismo passa pela mente. Nesse sentido, se faz necessário voltar os olhos para a milenar medicina oriental, e sua defesa de que praticamente toda doença tem origem na mente, ou no espírito, sendo o efeito físico apenas o estágio final de um processo que conhecemos muito pouco na chamada "medicina moderna". E não seria extremamente desconcertante descobrirmos que, talvez no final, a medicina altamente tecnológica esteja apenas queimando dinheiro em tratamentos avançados para doenças que poderiam ser evitadas de formas um tanto mais simples, humanas, econômicas? Ora, era Hipócrates quem dizia que são nossas própria forças quem curam nossas doenças, o tratamento visa principalmente, estimular nosso ânimo para a melhora... Ou, em outras palvaras, "mente sã, corpo são".

A acupuntura, por exemplo, é amplamente utilizada na veterinária. Porque ninguém questiona a acupuntura veterinária, mas questiona a acupuntura em humanos? O princípio do tratamento não é o mesmo? - Obviamente que a medicina-alternativa não serve para todo tratamento, e nem deve ser utilizada em substituição a convencional, mas em sua complementação. Na saúde pública brasileira, por exemplo, há relatos de experiências de substituição de analgésicos (para a dor) por seções de acupuntura, com enorme sucesso: os analgésicos saem muito mais caro, e se as pessoas conseguem deixar de sentir dor apenas com acupuntura, isso é uma economia imediata da verba pública. Além disso, a acupuntura tem bem menos contra-indicação do que a grande maioria dos remédios [1].

Patch Adams, um dos maiores médicos de nosso tempo, é provavelmente quase que ignorado nos grandes centros acadêmicos. Mas sua terapia do amor é uma enrome esperança para os que defendem que a medicina seja humanizada, e passe a utilizar a tecnologia em seu favor, e não continue como que sendo utilizada pela tecnologia, confundindo homens com máquinas. Seria injusto generalizar e afirmar que toda doença tem cunho psicológico, e que nosso humor é o único responsável por nossas enfermidades. Por outro lado, sabemos que a dor é vital para a melhora, e que sem a capacidade de sentir dor, provavelmente estaríamos extintos a muito tempo. Ora, existem dores de origem claramente física, como a dor decorrente de uma contratura muscular, ou de um vírus transmitido por um mosquito, por exemplo... Mas em relação a grande maioria das dores que nos acometem na vida, não podemos afirmar se são apenas físicas, ou emocionais - e, se forem primordialmente emocionais, psicológicas, mentais, é da mente que devemos tratar primeiro, e não do corpo. Do contrário, corremos o risco de ficarmos tal qual aqueles que tentam tapar a luz do Sol com a peneira, ou retirar água do poço com um balde furado.

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[1] Estudes recentes chegaram inclusive a resultados curiosos onde a acupuntura "falsa" obteve resultado mais positivo do que a medicina tradiconal, e tão positivo quanto a acupuntura "real". Fonte: Acupuntura "falsa" supera medicina comum em teste (Folha de S.Paulo).

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Artigos científicos recomendados:

» Bases psiconeurofisiológicas do fenômeno placebo-nocebo: evidências científicas que valorizam a humanização da relação médico-paciente.

» Acupuntura: bases científicas e aplicações.

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Crédito da foto: Wikipedia (Patch Adams)

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17.6.09

Alma sobrevivente

Fonte: Blog Revisionismo em Linha

Fiquei a par desta história bastante curiosa e não resisti em partilhar com todos vocês.

Trata-se da história de James Leininger que, duas semanas depois do seu segundo aniversário, começou a ter pesadelos alucinantes e com grandes dificuldades em conseguir parar. Quando James começou a gritar e a recorrer a frases como: "Avião a arder! O pequeno homem não consegue sair!", a sua família percebeu que tinha que fazer alguma coisa.

Como os detalhes de aviões e tragédias de guerra que nenhuma criança de dois anos poderia saber - descrições que passaram a ocorrer até durante o dia - não cessavam, Bruce and Andrea Leininger começaram a perceber que estavam perante uma situação inacreditável.

Toda a história está relatada no livro "Soul Survivor" (em inglês) e nele podemos ficar a saber como os Leiningers juntaram todas as peças com o objetivo de perceberem aquilo que o seu filho tentava comunicar e, eventualmente, descobrirem que ele poderia estar a reviver uma outra vida passada, nomeadamente com o nome de James Huston, um piloto de caças durante a Segunda Guerra Mundial.

Enquanto Bruce Leininger lutava por perceber o que estava a acontecer ao seu filho, ele ficou também a conhecer os detalhes da vida - e da morte - de James Huston, um piloto que fascinou completamente o mundo militar da época.

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Vejam também este curto documentário da TV americana ABC sobre o caso Leininger (legendado):

Ver a parte 2 (final)

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Nota (1): muitos céticos defendem que os relatos de casos de crianças que se lembram de vidas passadas são mais comuns no Oriente porque lá a maioria das pessoas acredita em reencarnação. Mas ultimamente temos verificado que esses casos ocorrem no mundo todo, talvez na mesma proporção. Ocorre que, são mais raros os relatos no Ocidente, exatamente devido ao fato de que aqui a crença na reencarnação é minoria. Isso, no entanto, não deixa de ser um benefício para o estudo da reencarnação: ocorre que no Ocidente somente os casos realmente sólidos, como esse, vem a tona e aparecem na midia.

Nota (2): lembremos também que não se trata da mera defesa de uma crença, mas de evidências paupáveis. Um garoto conseguir apontar, sem ajuda, o local exato da queda de um avião muitas décadas antes de ter nascido*, sobrevoando um território que nunca havia visto (nessa encarnação), é sem dúvida uma evidência que não precisa passar pelo crivo subjetivo - como por exemplo o fato de ele saber detalhes da vida da irmã de sua encarnação passada, onde a evidência é essencialmente subjetiva (de sua parte, e da irmã), embora não deixe de ser sólida.

* Maiores detalhes no livro "Soul Survivor".

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Céu e Inferno no elevador

Aqueles que andam de elevador no Standard Hotel em Nova Iorque são brindados com a instalação de arte criada por Marco Brambilla que abre uma "janela" para uma viagem do inferno ao céu, enquanto o elevador sobe ou desce.

"Civilization" é composto de mais de 400 vídeos tomados de filmes dispostos em repetição infinita. A viagem começa no inferno, passa pelos purgatório inferior, médio e superior, céu e céu superior para retornar ao inferno inferior.

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16.6.09

Pérolas de Espinosa

Textos de Benedito Espinosa em "Ética" (Editora Autêntica, tradução de Tomaz Tadeu)

Impossível enumerar os grande momentos de pura lógica e razão demonstrados através de uma delicada geometria contidos nas páginas da Ética. Aqui, porém, escolhi algumas pérolas da Quarta Parte - A Servidão Humana ou a Força dos Afetos:

Da perfeição (Prefácio)
Quem decidiu fazer alguma coisa e a concluiu, dirá que ela está perfeita, e não apenas ele, mas também qualquer um que soubesse o que o autor tinha em mente e qual era o objetivo de sua obra ou que acreditasse sabê-lo. Por exemplo, se alguém observa uma obra (que suponho estar inconclusa) e sabe que o objetivo de seu autor é o de edificar uma casa, dirá que a casa é imperfeita e, contrariamente, dirá que é perfeita se perceber que a obra atingiu o fim que seu autor havia decidido atribuir-lhe. Mas se alguém observa uma obra que não se parece com nada que tenha visto e, além disso, não está ciente da idéia do artífice, não saberá, certamente, se a obra é perfeita ou imperfeita. Este parece ter sido o significado original desses vocábulos. Mas, desde que os homens começaram a formar idéias universais e a inventar modelos de casas, edifícios, torres, etc., e a dar preferência a certos modelos em detrimento de outros, o que resultou foi que cada um chamou de perfeito aquilo que via estar de acordo com a idéia universal que tinha formado das coisas do mesmo gênero, e chamou de imperfeito aquilo que via estar menos de acordo com o modelo que tinha concebido, ainda que na opinião do artífice, a obra estivesse plenamente concluída. E não aprece haver outra razão para chamar, vulgarmente, de perfeitas ou imperfeitas também as coisas da natureza, isto é, as que não são feitas pela mão humana.

Da razão (Escólio da Preposição 18, e também mais de acordo com o logos do estoicismo)
Como a razão não exige nada que seja contra a natureza, ela exige que cada um ame a si próprio; que busque o que lhe seja útil, mas efetivamente útil; que deseje tudo aquilo que, efetivamente, conduza o homem a uma maior perfeição; e, mais geralmente, que cada qual se esforce por conservar, tanto quanto está em si, o seu ser. Tudo isso é tão necessariamente verdadeiro quanto é verdadeiro que o todo é maior que qualquer uma de suas partes. Além disso, uma vez que a virtude não consiste senão em agir pelas leis da própria natureza, e que ninguém se esforça por conservar o seu ser senão pelas leis da natureza, segue-se: 1. Que o fundamento da virtude é esse esforço por conservar o próprio ser e que a felicidade consiste em o homem poder conservá-lo. 2. Que a virtude deve ser apetecida por si mesma, não existindo nenhuma outra coisa que lhe seja preferível ou que nos seja mais útil e por cuja causa ela deveria ser apetecida. 3. Finalmente, que aqueles que se suicidam têm o ânimo impotente e estão inteiramente dominados por causas exteriores e contrárias à sua natureza. Segue-se, ainda, que é totalmente impossível que não precisemos de nada que nos seja exterior para conservar o nosso ser, e que vivamos de maneira que não tenhamos nenhuma troca com as coisas que estão fora de nós. (...) Portanto, nada é mais útil ao homem do que o próprio homem. Quero dizer com isso que os homens não podem aspirar nada que seja mais vantajoso para conservar o seu ser do que estarem, todos, em concordância em tudo, de maneira que as mentes e os corpos de todos componham como que uma só mente e um só corpo, e que todos, em conjunto, se esforcem, tanto quanto possam, para conservar o seu ser, e que busquem, juntos, o que é de utilidade comum para todos.

Da sociedade e do pecado (Segundo Escólio da Preposição 37)
Por qual razão (...) os homens, que estão necessariamente submetidos aos afetos e são inconstantes e volúveis, possam dar-se essas garantias recípocras e terem uma confiança mútua. Mais especificamente, é porque nenhum afeto pode ser refreado a não ser por um afeto mais forte e contrário ao afeto a ser refreado, e porque cada um se abstém de causar prejuízo a outro por medo de um prejuízo maior. É, pois, com base nessa lei que se poderá estabelecer uma sociedade, sob a condição de que esta avoque para si própria o direito que cada um tem de se vingar e de julgar sobre o bem e o mal. E que ela tenha, portanto, o poder de prescrever uma norma de vida comum e de elaborar leis, fazendo-as cumprir não pela razão, que não pode refrear os afetos, mas por ameaças. Uma tal sociedade, baseada nas leis e no poder de se conservar, chama-se sociedade civil e aqueles que são protegidos pelos direitos dessa sociedade chamam-se cidadãos. Com isso, compreendemos facilmente que, no estado natural, não há nada que seja bom ou mau pelo consenso de todos, pois quem se encontra no estado natural preocupa-se apenas com o que lhe é de utilidade, considerada segundo a sua própria inclinação. (...) Não se pode, por isso, no estado natural, conceber-se o pecado, mas pode-se, certamente, concebê-lo no estado civil, no qual o que é bom e o que é mau é decidido por consenso, e cada um está obrigado a obedecer à sociedade civil. (...) Por essas razões é evidente que o justo e o injusto, o pecado e o mérito são noções extrínsecas e não atributos que expliquem a natureza da mente [1].

Fazer o bem por temor do mal (Demonstração, Escólio e Corolário da Preposição 63)
Todos os afetos que estão referidos à mente, à medida que ela age, isto é, que estão referidos à razão, só podem ser afetos de alegria e de desejo. Por isso, quem se deixa levar pelo medo e faz o bem por temor do mal não se conduz pela razão.
Os supersticiosos, que, mais do que ensinar as virtudes, aprenderam a censurar os vícios, e que se aplicam a conduzir os homens não segundo a razão, mas a contê-los pelo medo, de maneira que, mais do que amar as virtudes, fujam do mal, não pretendem senão tornar os demais tão infelizes quanto eles próprios. Por isso, não é de admirar que sejam, em geral, importunos e odiosos para os homens.
Pelo desejo que surge da razão buscamos diretamente o bem e evitamos indiretamente o mal.

***

[1] Mas vale lembar que Espinosa defendia que toda a ação dentro das leis da natureza é uma ação boa e útil. Não no sentido egocêntrico, mas no sentido de que, ao seguir a natureza, o ser segue sua potência natural e estará alegre. As ações más não serão más porque a sociedade (ou certas concepções de Deus, por exemplo) às pune, mas porque vão contra a nossa própria natureza, antes de mais nada.

***

Crédito da foto: Laura Cammarata (série sobre os pecados)

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15.6.09

Einstein e os ateus fanáticos

Esta frase de Einstein demonstra com clareza a sua visão moderada da religiosidade:

"Então, existem os ateus fanáticos, cuja intelorância é igual à dos religiosos fanáticos, e vem da mesma fonte. Eles são como escravos que ainda sentem o peso das correntes que jogaram fora depois de muita luta. São criaturas que – em seu rancor contra a religião tradicional como sendo o 'ópio das massas' – não conseguem ouvir a música das esferas. O milagre da natureza não torna-se menor porque alguém não pode medi-la pelos padrões da moral e do sofrimento humano."

Obrigado ao David Fernandes pela tradução do original no blog do Del Debbio.

Fontes: The Expanded Quotable Einstein e Quotiki.com

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12.6.09

Uma breve história da magia, parte 3

continuando da parte 2...

Ritual da irradiação mental de certas cores para a auto-cura de certas enfermidades

Sei que havia prometido um ritual mágico na terceira e última parte desse breve estudo, mas é necessário que antes eu defina alguns conceitos:

1- Por ritual entendo, em última instância, uma série de procedimentos mentais que, de acordo com nossa definição de magia - "a ciência de se manipular símbolos, palavras ou imagens para se alcançar estados alterados de consciência" - visa a indução de nossa própria consciência a um estado alterado. Não é estritamente necessário o uso de indumentárias (físicas) como mantos, velas, imagens de santos, etc; Isso pôde ser comprovado inclusive por magistas renomados como o próprio Aleister Crowley, que já completou certos rituais, por força das necessidades, apenas pela disciplina da mente, por assim dizer. Obviamente que certos rituais são muito complexos para que nossas mentes consigam realiza-los sem nenhum auxílio de simbologia através de itens materiais, mas felizmente o ritual que apresento é muito simples e pode ser feito apenas com o pensamento corretamente direcionado.

2- Por irradiação mental entendo uma espécie de mentalização de certos símbolos, em certos contextos, e em certos graus de foco mental (quanto maior o foco, maior a eficácia, mas isso requer obviamente maior disciplina e experiência com a prática). Não se trata, certamente, de nenhum irradiação no sentido físico-científico do termo. Inclusive neste ritual em específico a irradiação estará direcionada ao próprio corpo do ativador do ritual.

3- Por cores entendo exatamente nossa interpretação simbólica das cores. Pela ciência sabemos que cores não existem, e sim espectros da luz, pois que tudo que chamamos de "cor" são frequências específicas de onda dos fótons (quantas de luz, ou do eletromagnetismo). Nossa interpretação - poderia-se dizer, subjetiva - dessas cores é essencialmente uma simbologia mental. Qual a vermelhidão do vermelho? Isso não pode ser medido objetivamente, depende da subjetividade de cada um. Além disso, para os daltônicos o vermelho certamente será algo muito distinto dos que não tem esse tipo de característica na visão. Disso se tira que o importante é o conceito que aplicamos mentalmente a uma cor, e não a cor em específico. Neste ritual o azul é o catalizador da cura, mas contanto que utilizem o mesmo conceito ao pensarem em qualquer outra cor, podem usa-la no lugar do azul sem problema algum (o azul seria apenas a cor tradicional utilizada para esse efeito, segundo a cromoterapia).

4- Por auto-cura entendo a própria capacidade natural da mente e do corpo de curarem a si próprios. Como dizia Hipócrates, pai da medicina: "tuas forças naturais, as que estão dentro de ti, serão as que curarão suas doenças". Por isso também nenhum médico promete cura, e sim tratamento. Este ritual visa o tratamento por "mentalizações de certos conceitos em forma de certas cores"; Não poderia ser resumido de melhor forma, acredito eu... A pergunta cética "é preciso acreditar para que funcione?" sequer faz sentido aqui, pois antes é preciso compreender para que funcione. É a própria compreensão de si mesmo, o próprio foco mental, que cataliza a cura. Se você já não acredita, de antemão, que o ritual possa trazer-lhe qualquer efeito benéfico, é melhor nem tentar realiza-lo. No entanto, talvez o estudo do efeito placebo, conceito científico, lhe traga maior luz sobre o que ocorre aqui - visto que, para a ciência, a mente tem o poder de cura quando acredita nesse poder; Falta-lhe, entretanto, a compreensão do mecanismo pelo qual o efeito placebo funciona exatamente.

5- Finalmente, vale dizer que aprendi esse ritual inicialmente com a médium Narci Castro de Souza (lembrem-se que minha definição de ritual mágico é abrangente, conforme dito anteriormente, e engloba desde o xamanismo às missas cristãs). Porém, adaptei-o a minha maneira, de modo que provavelmente pouco tem a ver com o original, exceto pela essência do que pretende realizar.

O ritual passo a passo
(Vale lembrar ainda que rituais mágicos não devem servir de "comprimido" para qualquer mero desconforto ou pequena enfermidade. Mesmo em se tratando de remédios físicos [como um anti-inflamatório], a dosagem exagerada fará com que o organismo não reaja mais a química do remédio; O mesmo ocorre na prática exagerada, e consequentemente sem o foco devido, de rituais mágicos)

A- De preferência, encontre um local (físico) tranquilo para a prática. Pode ser algum lugar sem ruídos de sua própria casa, algum jardim ou parque bucólico, uma praia vazia, etc. Não é necessário o uso de música, mas se está acostumado a usa-la para meditar ou relaxar, tanto melhor.

B- Feche os olhos e respire profundamente por algum tempo (depende de sua capacidade de relaxar, assim que conseguir esquecer "o mundo lá fora" por alguns instantes, estará bom). Imagine (mentalize com o devido foco mental) que está se transportando para um lugar de natureza exuberante, onde as "energias" que movem a natureza estão em estado puro. Se estiver em uma praia, imagine a essência de uma praia: a areia que erodiu ao longo de milhões de anos, a água mais pura e cristalina, o Sol que brilha e acalenta sem queimar, etc.

C- Imagine o céu em azul límpido, com núvens passageiras (aqui já estamos ativando a cor azul, como disse pode usar alguma outra, contanto que siga a essência do ritual - que é a irradiação da cor natural para dentro de si próprio). As aves que flutuam sem esforço nas brisas, e cantam para saudar o visitante conhecido (você mesmo). A mesma brisa que move as núvens e sustenta as aves também passa pelo seu corpo, e te envolve com a leveza de uma carícia.

D- Pense, brevemente, no motivo pelo qual está aqui: na enfermidade que deseja tratar. Lembre-se que na natureza não há garantia de cura, mas que ainda assim nos curamos inúmeras vezes de inúmeors males e enfermidades ao longo da vida. Pense: "tomara que esta seja mais uma vez". Então comece a respirar (apenas respirar ainda, sem exprirar) e imagine que o ar que respira é o próprio azul do céu, que desce e se irradia pelo seu corpo através da respiração.

E- Direcione este azul que entrou em seu corpo pela respiração para o local exato de sua enfermidade. Aqui, quanto maior for seu conhecimento biológico do corpo humano, e do mecanismo da respiração, tanto melhor. Se já estudou o que os remédios fazem para tratar certas enfermidades, imagine este azul como a essência da química curativa de tais remédios. Quanto maior a compreensão e conhecimento do que ocorre em um tratamento, melhor a eficácia do foco mental e da catalização do tratamento em si. Porém, o conceito essencial é o de que este azul, vindo diretamente do céu, está irradiando sobre sua enfermidade e absorvendo as células enfermas (ou a própria enfermidade em si), lentamente transformando-se em vermelho (novamente a cor não importa, o vermelho seria a enfermidade em si).

F- Agora expire, sem pressa, este vermelho. Imagine que a enfermidade é lentamente dissipada nas consecutivas respirações (do azul de tratamento) e expirações (do vermelho da enfermidade). O vermelho expelido não prejudica a natureza à volta, lentamente se dissipa ao se misturar com o ar. A enfermidade não deve ser encarada como punição, mas como um estado não natural do organismo, que em essência é naturalmente saudável. Viver traz enfermidades pois na natureza tudo se transforma, mas a essência da vida em si é saudável e infinita. Isso tudo são pensamentos que podem ser levados em consideração nessa hora.

G- Então agradeça a possibilidade de fazer uso das "energias" que movem a natureza. Agradeça aos animais que o saudaram, agradeça a possibilidade de viver. Então se despeça de todos que lá estão e imagine que está se transportando de volta ao local físico onde iniciou a meditação.

H- Abra os olhos e diga ou pense "graças a Deus", ou ainda "graças ao Cosmos", etc.

***

Nota: se eventualmente algum evento estranho ao passo a passo descrito ocorrer durante o ritual, aproveite-o apenas na medida em que se sentir bem. Se em algum momento sentir-se mal, seja por influência do que for, interrompa o ritual imediatamente passando diretamente para o passo H. Se esse mal-estar ocorrer frequentemente durante outros rituais, você poderá simplesmente deixar de os realizar, ou procurar alguma casa de estudos ocultos, ou alguma igreja onde se sinta bem, até que isso não mais ocorra durante os rituais.

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Crédito da foto: Onne van der Wal/Corbis

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10.6.09

A equação que mudou o mundo

Com sua equação, E=MC2, Einstein mudou o mundo. No entanto, a fissão nuclear não foi descoberta por ele, e a história nos conta como chegamos rapidamente ao mundo das bombas atômicas, através dessa surpreendente descoberta baseada no fato natural de que a massa da matéria nada mais é do que energia esperando por ser liberada.

Este video é parte (3 de 6) do documentário "Equação da Vida e da Morte", da BBC, e explica como se realiza a fissão nuclear e a reação em cadeia mortífera da uma explosão atômica:

E=MC2 significa que Energia é igual a Massa vezes a velocidade da luz (C) ao quadrado (vezes ela mesma) - ou seja, uma ínfima quantidade de matéria possuí enormes quantidades de energia (a bomba de Hiroshima foi detonada à partir de míseros 0,6g de massa).

No entanto, embora Einstein não tenha ficado sabendo ainda em vida, sua equação provou ser não somente uma equação de destruição, mas primordialmente de criação... A condensação da energia em matéria, após o Big Bang, possibilitou que estrelas, planetas e a vida como a conhecemos surgissem no universo, como é descrito no final do documentário:

Post relacionado: Você e o copo (II)

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9.6.09

Uma breve história da magia, parte 2

continuando da parte 1...

A evolução da simbologia mágica

Uma das maiores conquistas evolutivas do homo sapiens é a capacidade de reconhecer e interpretar símbolos. O termo "símbolo", com origem no grego σύμβολον (sýmbolon), designa um elemento representativo que está (realidade visível) em lugar de algo (realidade invisível) que tanto pode ser um objeto como um conceito ou idéia. Um símbolo pode ter representação gráfica (bidimensional ou tridimensional), sonora e até mesmo gestual - sendo o catalisador da linguagem e da cognição humana. Como diz o ditado: "uma imagem vale mais do que mil palavras"; No entanto, mesmo as palavras nada mais são do que símbolos elas mesmas.

A simbologia, tendo estado presente na evolução humana desde a pré-história, obviamente surgiu antes da escrita, que nada mais é do que um código de interpretação de símbolos bidimensionais (palavras). Quando nossos ancestrais pintavam animais nas cavernas, não estavam representando somente o animal em si, mas toda uma gama de conceitos simbólicos que hoje em dia talvez não possamos desvendar, mas provavelmente envolvia o animal em si, o espírito do animal (simbólicamente o conceito ou essência do animal), uma celebração pela oportunidade da caça do alimento, um pedido aos deuses pela abundância da caça, e talvez muitos outros conceitos. Não nos importa, para esse pequeno estudo em específico, procurar compreender as condições de nossos antepassados no horizonte tribal, mas sim o mecanismo peculiar pelo qual nossas mentes evoluíram na capacidade de interpretação simbólica.

Um mero símbolo, fosse um gravura na caverna, um escultura de pedra ou metal, um grito de guerra ou o gesto de um xamã, representava por si só uma série de conceitos e idéias entrelaçadas e encadeadas, que de certa forma evoluíram conosco ao longo das encarnações, não exatamente porque de alguma forma obscura nossos genes passaram essas informações adiante, mas simplesmente porque nós mesmos, ou nossas mentes, estavam lá - vivendo no horizonte tribal, caçando e sobrevivendo na imensidão do mundo. Não que seja impossível compreender a evolução da simbologia humana de outra forma, mas principalmente dentro do estudo da magia e do ocultismo, a reencarnação sempre foi um conceito chave, muito embora tenha sido mal compreendido ao longo dos tempos.

Além disso, a prática de magia surgiu primordialmente através da figura do xamã, uma espécie de mediador entre a tribo e os espíritos da natureza. A palavra xamã vem do russo, tungue saman corresponde à práticas dos povos não budistas das regiões asiáticas e árticas especialmente a Sibéria. Outros povos lhes darão outros nomes, como o pajé indígena da América do Sul ou o seiðr dos povos vikings da Europa, mas o que importa é que provavelmente foram os primeiros magistas da espécie humana. Há muitos céticos que atribuem o surgimento dessa mediação entre o xamã e os espíritos à crenças religiosas antigas de homens que, por não conseguirem compreender a natureza, atribuiram-lhe o mecanismo à função de seres sobrenaturais. Porém, o estudioso do oculto saberá muito bem distinguir o que era animismo e o que representava simplesmente o contato ancestral dos povos primitivos com os guias espirituais que, de uma forma ou de outra, sempre estiveram velando pela evolução terrestre. Nesse vai e vem de tribos e seres, a evolução espiritual se entrelaça e confunde com a evolução da cultura humana, e certamente não poderia ser diferente. Fato é que não há povo de caçadores-coletores que não seja guiado, em última instância, por um xamã (e toda nossa espécie surgiu desses povos).

Já a religião correu por caminhos ainda mais estreitos e obscuros. O horizonte tribal já havia passado, e com a agricultura surgiu o horizonte agrícola... Quase 3 mil anos antes de Cristo, na grandiosa cidade de Uruk, na Suméria, o templo de Ishtar dominava a civilização da primeira grande cidade. Ishtar, entretanto, era apenas mais um nome dado a Grande Deusa, que era adorada então por muitas outras culturas na Terra. Nada se comparava ao poder da mulher. Toda a vida provinha dela e sem seu alimento nenhuma vida sobreviveria. A Mãe era a vida. A Terra era a Mãe. Deus era Mulher. Deus era a Lua. O matriarcado e o canibalismo dominaram grande parte do período em que se cultuou a Grande Deusa, e o nascimento era o grande mistério.

Porém, o homem antigo continuava evoluindo, já compreendia melhor o mecanismo do seu nascimento (físico), e acabou por compreender que sem a luz do Sol, o solo não poderia ser fértil: em realidade o Grande Deus era o Sol. Ele passou a ser adorado por diversos nomes por todas as partes, sendo Osíris o nome mais relacionado ao estudo do oculto, pois foi durante seu culto que muito do que se estuda até hoje em ocultismo surgiu no Egito antigo, através da grande mente de Hermes Trimegisto, o três vezes grande. Essa nova "iluminação" resultou em avanços sem precedentes para a civilização. Armados com o conhecimento solar dos ciclos das estações, os lavradores começaram a organizar o culto das lavouras. Cidades surgiram e com elas as economias e os exércitos dos grandes Estados-nação. O patriarcado superou o matriarcado e as deusas de inúmeras culturas se tornaram "esposas" de novas divindades masculinas. O Sol no entanto "morria" todas as noites e "ressuscitava" todos os dias, sua morte era o novo mistério. E assim os deuses dos grandes cultos - Orfeu, Hércules, Dionisio e até mesmo Cristo - foram assassinados e ressuscitaram. A narrativa de Perséfone nos Mistérios de Elêusis é um exemplo perfeito da evolução da simbologia da Grande Deusa para a simbologia do Grande Deus.

Foi necessária a compreensão científica de que o Sol era "apenas" uma esfera incandenscente em volta da qual a esfera terrestre fazia viagens anuais, de acordo com a gravitação universal, para que o grande mistério da morte fosse lentamente sendo deixado de lado. Não havia mais necessidade de temer as trevas, nem a morte. Para quem nunca compreendeu a Deus, e cultuava um "deus da barganha", que enviava os seres para o Inferno ou para o Céu, de acordo com seus pecados, a questão da existência retornou em plena força: nada mais estaria garantido sem a acomodação dessa crença vazia da barganha de nada por coisa alguma, e portanto a transição não foi pacífica - que o digam as fogueiras medievais. Desde esses novos tempos temos visto a queda do colonialismo e a destruição dos últimos vestígios do domínio patriaracal dos reis europeus, juntamente com o poder da Igreja. A simbologia do culto a Grande Mãe (violentamente reprimida durante o culto solar) foi transformada pela evolução da consciência humana, e ressurgiu na forma de movimentos relacionados ao meio ambiente, ecologia e a emancipação das mulheres na sociedade moderna.

Nessa nova época, a que muitos chamam de Nova Era, a consciência espiritual da humanidade desperta aparentemente subitamente, como se doutrinas a exemplo do espiritismo e da umbanda sagrada fossem completamente novas, revelaçoes divinas; O estudate do oculto, entretanto, percebe claramente o encadeamento da teia da vida e da lenta evolução humana, passo a passo em direção ao infinito. Ação e reação, causa e efeito. Um turbilhão de símbolos a girar pelo universo imenso e abrangente - o que a consciência humana é capaz de perceber e compreender hoje, pagou com o sangue e o suor de milhões de anos de evolução. Nós temos percorrido um longo caminho, cheio de armadilhas e passadas em falso, cheio de ignorânica e incompreensão, cheio de doutrinas míopes, porém certamente não absolutamente cegas... O Deus que buscávamos no mistério do ventre da Terra-Mãe, que tateamos na escuridão das noites aflitos pela ausência do Sol-Pai, e que hoje temos a chance de compreender à fundo através do estudo meticuloso dos mecanismos da natureza, é o mesmo do qual nascemos, o mesmo ser-substância eterno e imutável para a qual inevitávelmente iremos um dia retornar, senão fisicamente, decerto espiritualmente. O que está em cima é como o que está embaixo, mas nunca estivemos "longe" ou "fora" de Deus: essa é a grande fórmula mágica, a grande compreensão, o grande mistério do existir.

Na continuação, irei encerrar com um ritual mágico, para ninguém dizer que nunca ensinei nada oculto por aqui...

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Bibliografia (da parte 2): "A Magia de Aleister Crowley" - Lon Milo DuQuette (apenas no que tange a história dos eóns da magia) - editora Madras; "O Espírito e o Tempo" - J. Herculano Pires - editora Paidéia.

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Crédito da imagem: Wikipedia (lista de deuses da Suméria em escrita cuneiforme)

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