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Uma rima rápida

Uma rima rápida é como um trovão de poesia:
O retoar atordoa, e a luz se propaga com maestria.

Há quem leia as duas frases acima e passe adiante, desapercebido - "hmm tá bem, e o que tem isso?" - e há quem reconheça ali, ainda que de modo superficial, uma "fragância" de poesia. Não cabe a nós julgar o que tange a percepção de cada um: cada qual percebe aquilo que pode, aquilo que tem interesse e, sobretudo, aquilo em que mantém o foco mental.

Decerto poesias não enchem a barriga de ninguém. Pode-se dizer, de modo mesmo prático: e que adianta a poesia? Por acaso a poesia vai resolver a miséria do mundo? As guerras? A ignorância? - A poesia é uma forma de arte, uma simbologia do sentido do ser e do "estar vivo", a poesia não está aqui para resolver o problema do mundo, nem mesmo o problema de ninguém em especial. Somos nós que resolveremos nossos problemas, no meio do caminho talvez a poesia nos ajude, talvez não, mas fato é que há quem ame poesia e há quem nunca tenha sequer compreendido seu significado mais básico. Porque afinal somos assim tão distintos? Será possível que se aprenda a compreender poesia?

Não sei ao certo se aprende-se a compreender poesia. Mas tenho quase certeza que aprende-se a sentir o mundo, e não apenas racionaliza-lo - Será que o mundo é apenas aquilo que foi descoberto pela ciência? Nesse caso, será que antes da ciência descobrir que a Terra girava em torno do Sol, esta preferia seguir a crença comum de que era exatamente o inverso, de que era o Sol que girava em torno da Terra? Está óbvio que não: ainda que o mundo se limitasse ao que nossa razão é capaz de compreender, ainda assim teríamos uma infinidade de coisas desconhecidas a bailar pelo Universo a nossa volta.

Fazer, entoar, participar da poesia é celebrar todo esse "desconhecido" a nossa volta. É exatamente não racionaliza-lo, apenas, mas também tentar compreendê-lo pelo sentir, como quem tenta compreender uma fragância de perfume por seu cheiro, e não pelo logotipo da embalagem, ou pela lista dos produtos químicos em sua composição. Entoar poesia é estar aqui e agora, tão somente vivendo, em certo sentido, dentro da simbologia que aquelas palavras nos despertam em nosso íntimo.

Obviamente que a poesia acima é somente um exemplo auto-referente, que quando muito pode despertar certa simpatia em alguns admiradores de poesia, porém ainda assim serve como exemplo para que nos indaguemos acerca de certos símbolos em nossas mentes: o que será um trovão de poesia? Imaginamos um trovão no céu chuvoso, ou uma chuva de palavras descoordenadas? Será que o trovão se refere apenas ao sentimendo de medo e deslumbramento perante a Natureza quando esta nos envia uma tempestade? Porque será que o retoar de um trovão atordoa? Será pelo som que faz, ou pelo sentimento ancestral que nos desperta? Será que entoar tem a ver com retoar? Será que se entoa poesia como a Naturza nos envia trovões? Será que a Natureza é um poeta impessoal? Será que Natureza é poesia em estado bruto? Será que, como a luz, os sentimentos se propagam em meio aos céus revoltos das tempestades? Será que essas indagações fazem parte desta poesia tão simples? Onde será que termina uma poesia?

Poderíamos ficar assim indeterminadamente. Difícil dizer se isso é racionalizar ou sentir. Talvez a mera tentativa de classificar um sentimento seja racionaliza-lo. Porisso o homem não se comunica somente por sons ou gestos, mas também por algo de misterioso e poético, um relance de olhar, uma expressão indeterminada, algo que chamamos "empatia", o dedilhar do violão de um bardo, o entoar de uma oração sacra, ou apócrifa, ou uma oração que se faz na hora, e nunca mais se repete, um eterno celebrar da vida e do desconhecido. O viver aqui e agora, sem medo, nem dó, nem pena, nem nenhuma expectativa além daquela que a Natureza já nos promete a todo momento: a expectativa de ser realmente real tudo aquilo que sentimos ou racionalizamos.

Como atordoa,
Como atordoa...
Entoar poesia.

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Crédito do desenho (com alteração digital): Albrecht Durer

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19.2.09

João de Deus: charlatão?

Este artigo visa analisar o fenômeno das cirurgias físicas efetuadas pelo médium João de Deus, a que muitos céticos encaram como charlatão ou fraude. No entanto, independente de aprovarmos ou não tais cirurgias (ao que tudo indica são os próprios pacientes que pedem por elas), devemos aqui analisa-las somente no contexto do pretenso fenômeno "paranormal" em si, sem que para isso deixemos que noções materialistas influenciem nossa visão. Este artigo pretende analisar esse tipo de fenômeno de forma verdadeiramente cética e imparcial.

Como dito em nosso último artigo sobre ele, João de Deus nasceu em 24 de junho de 1942 em Cachoeira da Fumaça, interior de Goiás. Muito pobre, estudou até o segundo ano primário e em seguida abandonou a escola com o intuito de procurar trabalho e ajudar no sustento dos cinco irmãos. As manifestações mediúnicas começaram quando ainda era menino. Em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, teve início o seu trabalho de cura. Após uma visão embaixo de uma ponte, foi orientado a procurar um centro espírita na cidade. Lá chegando, foi recebido à porta pelo presidente do centro, que disse já estar esperando por ele. João se aproximou e subitamente desmaiou. Ao acordar, ficou sabendo que, incorporado, havia operado e atendido a diversas pessoas. Desde então não parou mais de realizar trabalhos de cura.

Em 2005 o dismistificador James Randi participou de um programa da rede americana ABC que visava analisar o fenômeno das cirurgias físicas de João de Deus. Apesar de apenas ter visto alguns vídeos sobre essas cirurgias (provavelmente imaginando que não era possível ir até lá e filmar do ângulo que quiser), ele logo teceu alguns comentários que tem como objetivo dismistificar o fenômeno apresentado, afirmando se tratar de truques de mágica "até mesmo simplórios".

Logo abaixo, iremos contrapor as suposições de Randi com um estudo médico sobre cirurgia espiritual da Associação Médica Brasileira (inclusive baseado em observações das próprias cirurgias de João de Deus), do qual tiraremos algumas citações quando necessário[1]:

1. Sobre as tesouras enfiadas pelo nariz dos pacientes.
Randi afirma que isso não passa de um truque de circo bastante conhecido. No entanto, se esquece de que para que o truque funcione, o mágico precisa enfiar o objeto (no caso, algum prego longo e não uma tesoura) no próprio nariz. Não se conhece esse tipo de truque efetuado em outras pessoas não preparadas. Para se conceber que João de Deus faça isso como forma de mágica, seria preciso crer que as dezenas de pessoas operadas todos os dias, incluindo os próprios pesquisadores e repórteres de dezenas de emissoras (incluindo Discovery e BBC) foram não apenas subornados para compactuar com o "show" de João, mas da mesma forma treinados na técnica. Como o próprio Randi admite que apenas algumas centenas de pessoas conhecem a técnica ao redor do globo, ele mesmo se contradiz.

2. Sobre os cortes de pele sem sangramento normal.
João de Deus faz incisões na pele de pacientes e estes não sentem dor e quase não sangram, apesar de não estarem anestesiados (quanto ao não-sangramento, nem se conhece alguma substância química que possa causar tal efeito). Resta a Randi apelar para um truque de mágica mais elaborado, que ele mesmo demonstrou algumas vezes em programas de TV. Randi esquece, porém, que para tais truques funcionarem precisamos de: (A) Posição específica da câmera, proibindo certas angulações de filmagem; (B) Compactuação e participação do paciente; e (C) Espelhos, pele falsa e outros elementos de tecnologia específica da mágica. Ou seja, (A) é refutado pois podemos filmar as cirurgias por qualquer ângulo, inclusive circundando o médium e o paciente; (B) é refutada pelo mesmo motivo da citação #1 acima; e (C) é refutada pois até hoje não se encontrou nada parecido no "santuário" do médium.
Também vale citar a pesquisa da AMB: "As cirurgias são reais[2], mas, apesar de não ter sido possível avaliar a eficácia do procedimento, aparentemente não teriam efeito específico na cura dos pacientes."

3. Sobre as "raspagens de olho".
João de Deus efetua "raspagens" de um dos olhos dos pacientes utilizando nada mais que a própria mão e uma faca de cozinha não esterilizada. Randi, não tendo muito a acrescentar ao assunto, admite que "seria impossível tocar a córnea do paciente sem uma reação adversa imediata (como piscar ou se afastar) do mesmo, exceto por meio de uma anestesia local aplicada sem que o paciente saiba". Bem, como não está provado que exista qualquer tipo de anestesia aplicada, e João opera dessa forma a décadas, fica difícil imaginar que se trata de fraude.
Voltando a citar a pesquisa da AMB: "As cirurgias e raspados são reais e os materiais extraídos são compatíveis com o local de origem."

4. Sobre a ausência de dor nos procedimentos citados em #1 a #3.
Randi afirma que as "vítimas" podem estar em um "estado de choque" refrente ao trauma, e que porisso não sentem dor no momento, mas podem vir a sentir alguns minutos depois. Ele afirma que a "câmera não continuou filmando o paciente, então não podemos saber" - Aqui se torna evidente que Randi se expõe ao ridículo por fazer tantas suposições sobre um fenômeno que mal conhecia. É muito simples encontrar no YouTube diversos vídeos dessas cirurgias onde fica atestado que os pacientes não sentem nenhuma dor, mesmo horas depois. O mesmo vale para diversos documentários, como os da Discovery e BBC.
Na pesquisa da AMB, dos 10 casos estudados, apenas uma paciente sentiu dor em uma incisão mamária com retirada de fragmento (pretensamente um nódulo benigno), mas não uma dor forte como seria de se esperar normalmente.

5. Sobre a ausência de infecção (hospitalar).
Em décadas de cirurgias físicas sem a instrumentação, anestesia e assepcia adequados, nunca foi constatado um caso sequer de infecção hospitalar nos pacientes de João de Deus, inedependente de ter havido cura ou não no tratamento espiritual. Randi aqui apela para a explicação "de que nem todos os procedimento invasivos realmente cortam completamente o tecido da pele (como um ferimento exposto), e isso poderia explicar a ausência de infecções". Randi mal sabia que João também faz cirurgias extremamente invasivas, apenas estas são mais raras.
Em todo caso, a pesquisa da AMB estudou algumas dessas cirurgias invasivas, e mesmo assim confirmou que não houve casos de infecção: "não há utilização de técnica asséptica ou anestésica, mas não foi detectada nenhuma infecção e apenas um paciente referiu dor."

6 e 7. Sobre os "transes" em que o médium "entra em contato com espíritos" e sobre as recuperações e curas reportadas por pacientes.
Não queremos aqui analisar a crença de Randi em si. Obviamente, como cético, ele não pode conceber uma explicação espiritual para esse tipo de fenômeno. Não criticamos aqui o ceticismo de Randi, mas o exaltamos e reafirmamos: cada um deve crer naquilo que quiser. O problema está no julgar sem saber, como ficou claro nesse caso. Julgar fraude de antemão um fenômeno mal estudado, apenas porque vai contra sua crença (ou descrença). Nesse ponto, o ceticismo de Randi é obviamente falho. Não tiramos seu mérito de dismistificar diversos charlatões pelo mundo, mas lamentamos sua falta de critério para com esse caso em específico.
Sobre as curas comentaremos à seguir.

***

Médico não promete cura, promete tratamento
Essa frase, que ouvi do célebre e amoroso médico Patch Adams (que é inclusive ateu), resume muito do que devemos considerar acerca desse tipo de cirurgia ou tratamento. Vale mencionar que "assim como outros cirurgiões espirituais brasileiros, João Teixeira afirma que as cirurgias são completamente dispensáveis, podendo os espíritos atuarem diretamente sobre os pacientes. Mas estes necessitariam ver as curas sendo realizadas no corpo físico para se convencerem da realidade do tratamento" (novamente citando a pesquisa da AMB), ou seja, lembrando Hipócrates, podemos também afirmar que "tuas forças naturais, as que estão dentro de ti, serão as que curarão suas doenças" - ou seja, entenda-se como quiser, que "a fé cura" ou que "o efeito placebo cura", o importante é que alguma espécie de cura (ou melhoria) ocorre para quem se mantém confiante e otimista, e isso é fato mesmo na medicina tradicional.

Falando do ponto de vista espiritualista, me parece óbvio que o ideal seria que João parasse com esse tipo de cirurgia física. É difícil dizer até que ponto elas lhe auxiliam em sua jornada de caridade, e até que ponto apenas lhe trazem uma exposição indesejada na mídia mundial. Decerto, é claro, lhe traz muitos inimigos céticos, que chegam até a classifica-lo como "açougueiro". Obviamente que, num estudo mais detalhado, como o da AMB, percebemos a realidade de suas cirurgias, e o bem (direto ou indireto) que produz em seus pacientes.

Mas o fato é que, mesmo de acordo com o próprio João, as cirurgias físicas são desnecessárias para o tratamento. A matéria espiritual é fluida, e como tal, não se opera por mãos físicas, mas antes pelas mãos sutis do pensamento, ou pelo menos é mais ou menos como os espiritualistas compreendem o fenômeno em si. Nada mais sóbrio do que optar pela eventual redução desse tipo de cirurgia, até que não mais seja realizada, mesmo que as pessoas continuem lhe pedindo para tal.

Também vale lembrar que João opera gratuitamente a décadas, e que por mais que a "venda de remédios naturais a 10 reais" e o turismo da região possa até lhe trazer certa renda, não seria suficiente para garantir o funcionamento de seu "santuário", e toda a caridade que próvem dele (incluindo doação de comida e alojamento aos mais necessitados, etc.). Portanto João, como todos nós, depende da caridade, mas além de depender dela, também a realiza, em abundância. Julguemo-o por sua obra.

Conclusão final da pequisa da AMB (veja a pesquisa aqui)
"Pode-se concluir que as cirurgias estudadas e os materiais extraídos são reais, não há utilização de técnica asséptica ou anestésica, mas não foi detectada nenhuma infecção e apenas um paciente referiu dor. Como não houve identificação de fraudes, o fenômeno necessita de posteriores estudos para a explicação adequada da analgesia, da não-infecção, avaliação da eficácia e por quais mecanismos a suposta cura poderia ocorrer, pois as cirurgias em si aparentemente não conduziriam a esse resultado, já que usualmente não extraem tecidos patológicos.

Como vários autores relatam benefícios com os tratamentos espirituais, é fundamental um melhor conhecimento dos mecanismos e eficácia das curas espirituais. Isso possibilitaria a adaptação das formas úteis como terapias complementares à medicina ocidental, bem como desencorajaria os procedimentos danosos ou inúteis. A discussão séria de um tema não requer que compartilhemos as crenças envolvidas, mas que tomemos suas implicações seriamente e não subestimemos as razões pelas quais tantas pessoas se envolvem. Nem a crença entusiasmada ou a descrença renitente ajudarão os pacientes ou o desenvolvimento da medicina".

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Notas:

[1] Este estudo foi realizado por pesquisadores e médicos filiados a Associação Médica Brasileira, e é somente nesse sentido que me refiro a pesquisa como "uma pesquisa da AMB". Não quer dizer que a AMB seja espiritualista, ou materialista, nem que os médicos que conduziram a pesquisa sejam uma ou outra coisa - até mesmo porque a ciência não é, em si, nem uma coisa nem outra.

[2] As cirurgias são reais no contexto de negarem a insinuação de James Randi de que seriam "truques de mágica". Não quer dizer que tenham resultado em cura. Aliás, se lerem a pesquisa completa da AMB verão que a efetividade do tratamento espiritual não é confirmada, embora nenhuma fraude tenha sido verificada nas cirurgias em si.

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Este artigo também pode ser visualizado pelo endereço http://tinyurl.com/joaodedeus

Crédito da foto: Sakanta Running Wolf

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18.2.09

Introdução a psicografia

Normalmente eu não gosto de postar esse tipo de reportagem de TV, pois fica parecendo que estou apenas tentando fazer "divulgação". Mas nesse caso dessa reportagem sobre psicografia e espiritismo no programa Mais Você, apresentado por Ana Maria Braga na Rede Globo, acredito que seja válida a postagem devido a algumas reflexões interessantes que podemos retirar dali; seja para céticos, seja para espíritas, seja para não-espíritas porém religiosos.

Além das explicações simples e didáticas sobre a origem da doutrina espírita e da psicografia de acordo com o espiritismo, temos a presença de Divaldo Pereira Franco que, além de dar em vídeo prévio um depoimento interessante sobre como iniciou na mediunidade (que pode ser entendido de várias formas pelos céticos), dá algumas explicações sobre a doutrina. De qualquer forma, o interessante é atentar aos fatos que Ana Maria expõe: que Divaldo ajuda com sua obra social, a Mansão do Caminho, mais de 5 mil pessoas diretamente (ele tem 600 filhos adotivos e 200 netos); que já psicografoiu e publicou mais de 200 livros, alguns traduzidos para até 16 idiomas diversos (toda renda vai para caridade); e finalmente, que já fez mais de 11 mil conferências em 2 mil cidades em todo o Brasil e em 62 países, e continua fazendo mesmo com mais de 80 anos de idade (nesse caso, julguemo-o, céticos ou não, por suas obras, independente de sua crença).

Ainda temos o exemplo de um menino prodígio no piano, que praticamente "naseceu sabendo como toca-lo magistralmente". Dentre outros fatos ocorridos com o menino (como "aprender" a tocar músicas que "ouviu dormindo em um teatro"), Divlado traz a explicação espírita de que se trata de reencarnação (neurologistas como Oliver Sacks, que estudam autistas savants, tem outra opinião, mas o fato é que a ciência não explica por onde vem toda essa genialidade). O fato é que casos parecidos existem aos montes pelo mundo.

Depois temos o depoimento de um pai que perdeu o filho e, através de carta psicografada por Chico Xavier, obteve a certeza de que ele ainda existia consciente em algum lugar. Este pai teve o cuidado de conferir algumas informações na carta, além de nomes de diversos familiares, o cálculo do tempo exato em que esteve vivo na última encarnação (até as horas e minutos), o que nem mesmo o próprio pai havia calculado, mas que se mostrou exato. O último depoimento fica por conta de uma atriz veterana que perdeu 2 de seus filhos e encontrou consolo na doutrina espírita por intermédio do saudoso diretor da Globo, Augusto César Vannucci, que lhe "emprestou" o Ev. Segundo o Espiritismo para leitura. Apesar de ser apenas uma afirmação de crença (o que para os céticos não significa muito), é inegável o quanto seu depoimento emocionou a todos.

Fato é que o espiritismo encontra cada vez mais espaço na mídia, e não apenas no Brasil como em universidades emblemáticas ao redor do mundo. Isso tudo sem pretender "evangelizar" ninguém, sem cobrar dízimos (nada contra, apenas registrando o fato aqui) e doando-se a caridade e a reforma moral como maior objetivo. Cada um julgue o espiritismo conforme sua consciência, porém vale lembrar da frase de Divaldo lá pelo fim da reportagem:

"A mensagem espírita não é uma mensagem ortodoxa. Nós respeitamos todas as religiões e não-religiões. Para nós o importante não é ter uma crença, é ter uma conduta (moral). E nós optamos as vezes por um indivíduo sem religião, mas bom cidadão, do que por um religioso mal-cidadão."

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Obs: Caso o vídeo acima não carregue, tente abri-lo no próprio site do programa.

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13.2.09

Novo Pai Nosso

Faz algum tempo eu postei algumas considerações sobre a famosa oração do Pai Nosso. Essas considerações foram tão mal compreendidas (em discussões no Orkut) que eu cheguei a considerar retirar esse post do ar. Em todo caso, minha intenção era apenas fazer com que os que consideram essa oração refletissem acerca do que ela significa, e de como poderíamos "apurar" um pouco mais nosso entendimento dela. Não é o caso de entoa-la de outra forma, trocando as palavras (quem sou eu para sugerir isso), mas se fosse:

Pai nosso que estais em toda parte
Percebemos que és santificado por tua obra
Que vosso reino está a nossa volta
Que vossa vontade é feita nas esferas
E no infinito do cosmos

As leis que nos mantém a todos
Faz com que continuem inalteradas
Faz com que ao perdoarmos nosso próximo
Percebamos a necessidade
De perdoar também a nós mesmos

Que não caiamos na tentação
De crer que o que ocorre a nós
Depende mais de vossa vontade
Do que da nossa própria

Assim sempre foi e sempre será

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12.2.09

A evolução desconhecida

Neste dia onde comemoramos os 200 anos do nascimento de Charles Darwin, co-criador da teoria da Evolução com Alfred Russel Wallace, gostaria de falar sobre a parte ainda "desconhecida" da evolução das espécies, e principalmente a do homo sapiens.

Como Drausio Varella e outros antropologistas gostam de lembrar, a evolução cultural não se deu apenas no homo sapiens, como em outras espécies capazes de conviver em sociedade, como chipanzés e bonobos, nossos parentes mais próximos (segundo os estudos do Genoma Humano comprovaram). E não paramos por aqui: muitos psicólogos evolutivos fazem alarde sobre a teoria da evolução da mente humana - "Homens traem mais pois na Idade da Pedra precisavam disseminar a espécie em diversas parceiras, sob o risco de condenar sua espécie a extinção caso fossem monogâmicos numa época ainda absolutamente inóspita a sobrevivência sedentária." - esse tipo de afirmação é muito comum entre os defensores da PE Pop (Psicologia Evoltutiva Populacional).

Em artigo recente na Scientific American, o prof. David J. Butler critica a afirmativa de que "o homem moderno tem a mente da Idade da Pedra", e expõe diversas razões, na maioria falta de evidências, para que consideremos essa afirmação uma falácia. Entretanto, se perguntarmos a qualquer cético que crê na teoria da Evolução, o fato de que existe a evolução cultural e cognitiva humana é quase que sempre dado como verdadeiro... Interessante pois que, independente de críticas como as do prof. Butler, exista um problema muito mais importante e crucial para ser resolvido: "Como é possível que Genes, que transmitem apenas características físicas, possam carregar informações ou memórias de uma possível evolução cultural e cognitiva da espécie?".

Até hoje, pouco se desenvolveu esse assunto na literatura científica. Podemos aqui destacar que Dawkins percebeu o problema, tanto que se preocupou em delinear uma vaga teoria acerca dos Memes, teoricamente os "genes que transmitiriam as características não-físicas adiante"... Infelizmente o célebre autor do Gene Egoísta não conseguiu encontrar essa outra espécie de "genes exóticos" em lugar algum, e nem tampouco qualquer outro pesquisador. Os memes continuam sendo alternativas místicas aos genes.

Também podemos citar Jung e seu Inconsciente Coletivo, segundo a Wikipedia ele "é a camada mais profunda da psique humana. Ele é constituído pelos materiais que foram herdados da humanidade. É nele que residem os traços funcionais, tais como imagens virtuais, que seriam comuns a todos os seres humanos." - Seria então, mais ou menos, como quintilhões de bits de informação que "flutuam no ar" e, de alguma forma desconhecida, são acessados não somente por homo sapiens conscientes, como também por todas as outras espécies que obtiveram alguma forma de evolução cultural ou cognitiva - ou seja, não dependeríamos de genes para passar tais informações adiante, elas estariam simplesmente "em algum lugar do espaço". E chamaríamos isso de ciência ou de esoterismo?

É verdade que a teoria de Darwin-Wallace nunca pretendeu explicar a origem da vida, apenas trazer luz a forma com a qual essa vida evoluiu de simples bactérias para seres formidáveis e complexos, numa infinidade de espécies. A teoria da Evolução nunca casou muito bem com a noção de evolução da cultura e cognição nas espécies, e se mostrou especificamente limitada em explicar o surgimento da consciência. Poderemos imaginar que isso se explica pelo fato de que ambos os criadores de tal teoria serem cientistas e céticos, que nada compreendiam de espiritualidade. Então estaríamos errados...

Não é à toa que Wallace é tão pouco citado quando se fala na teoria da Evolução - primeiro, era bem mais jovem que Darwin quando a teoria lhes surgiu a ambos, mas principalmente, Wallace foi espiritualista, e um cientista espiritualista é algo que nunca soou muito bem aqueles que escrevem a história da ciência... Segundo a Wikipedia e suas fontes, Wallace "argumentou que a seleção natural não poderia justificar o gênio matemático, artístico ou musical, nem contemplações metafísicas, a razão ou o humor, e que algo no "invisível universo do Espírito" tinha intercedido pelo menos três vezes na história: 1. A criação da vida a partir da matéria inorgânica; 2. A introdução da consciência nos animais superiores; 3. A geração das faculdades acima-mencionadas no espírito humano." - Ora, não é tão fácil desacreditar o pensamento de um espiritualista, quando este é um dos responsáveis pela teoria mór do materialismo, não é mesmo?

Mas poderemos pensar: será que ciência e religião estão em lados opostos? Será que materialismo e espiritualismo nunca se encontraram? Será que a Natureza se explica por noções radicais, preto no branco, como "tudo é matéria" ou "tudo é espiritual e ilusório", ou será que Natureza antes opera em gradações de cinza?

O que Wallace defendia é conhecido pela humanidade desde milhares de anos atrás, nos primórdios das religiões orientais, principalmente do Hinduismo (mesmo Sagan traça paralelos entre as teorias de criação/destruição do Universo e a cosmologia religiosa da antiga India). Consciência, alma ou espírito, chame-a como achar melhor, o que a teoria da Reencarnação defende é tão somente que existe uma lógica perfeitamente plausível por detrás da crença de que a consciência e a memória não dependem de genes para serem passadas adiante, simplesmente pelo fato de que, ao contrário do corpo dito "físico", não são exterminadas na morte.

Num Universo não-local, onde 96% da matéria não interage com a luz, e onde pululam teorias físicas acerca da existência de diversas dimensões, branas, ou mesmo universos palralelos - e mais, onde sabe-se a tempos pela ciência que toda matéria é invisível e intangível - será assim tão fantástico e absurdo imaginarmos que a consciência, algo que sequer detectamos no cérebro humano, e que não sabemos do que é formado, possa sobreviver ao fim das atividades cerebrais?

Pode ser que no futuro a ciência descubra que realmente a consciência nada mais é do que um estado exótico do cérebro, fruto de reações químicas que possibilitaram que poeira de estrelas pudessem adquirir conhecimento do céu noturno, e do Cosmos das quais são filhas. No entanto, negar de antemão a possibilidade da evolução "desconhecida" se dar através de caminhos igualmente ocultos, e apostar todas as fichas no materialismo, me parece algo arriscado... Afinal, todos podemos estar errados, então não deveríamos apontar raivosos e dizer "você está louco, isso não pode estar certo!" - E quem disse que a Natureza obedece aquilo que "achamos estar certo"?

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Crédito da foto: corbis

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Espiritismo em Cambridge e Oxford

Segue a notícia do blog português "A Casa da Boa Vontade":

O Professor Doutor Luís de Almeida, cientista português da Agência Espacial Europeia (ESA) e da Agência Espacial Norte-Americana (NASA) levou a Doutrina Espírita aos rigorosos meios acadêmicos das Universidades inglesas de Cambridge e Oxford.

Na respeitada Universidade de Cambridge que deu ao mundo oitenta e um "Prêmios Nobel" e albergou nomes como Sir Isaac Newton, Bertrand Russell, J. J. Thomson, Ernest Rutherford, Niels Bohr, Paul Dirac, Max Born, James Watson, Steven Weinberg e Stephen Hawking entre tantos outros... o cientista português levou a cabo duas conferência sobre "O que é espiritismo, e o que não é espiritismo" e outra sobre "O Papel do Espiritismo na sociedade vigente e a importância do Espiritismo na vida de um cientista”. O evento decorreu no dia 14 de Julho, às 9 horas e segunda conferência às 14 horas e teve lugar no conceituado «Instituto de Ciências Matemáticas Isaac Newton», dirigido, actualmente pelo Professor Doutor Stephen Hawking, com o título de professor lucasiano (nome que se dá a uma cátedra) outrora ocupada por Isaac Newton.

É a primeira vez que um espírita, profere uma palestra sobre o Espiritismo na conceituadíssima Universidade de Cambridge, Faculdade de Matemática da Universidade de Cambridge e no Instituto de Ciências Matemáticas Isaac Newton do Reino Unido, e para um público totalmente europeu onde só constavam cientistas, professores e estudantes universitários. O auditório totalmente lotado comportou cerca de 500 pessoas.

Tudo começou com uma brincadeira entre cientistas ingleses, irlandeses e escoceses com o cientista português. Face à racionalidade com que o Prof. Dr. Luis de Almeida “fala” sobre a Doutrina Espírita na seio da “família” de cientista, esta despertou o interesse dos seus colegas que sem ele saber tinham agendado uma conferência espírita, exclusiva ao meio académico. Conferência essa que nem sequer foi divulgada e o pesquisador português até a desconhecia. Soube dois dias antes já que tinha que se deslocar à Universidade de Cambridge em trabalho.

O cientista Luis de Almeida abordou sempre de forma magistral um paralelismo constante entre Espiritismo e Ciência (Astrofísica e Cosmologia): falando-nos primeiramente dos fenômenos espíritas, que despertou interesse ao longo da história da humanidade, levando a vários cientistas como o físico-químico inglês Sir William Crookes o astrônomo francês Camille Flammarion e o pedagogo francês Hippolyte Léon-Denizard Rivail (Allan Kardec) entre tantos outros homens de ciência, a se interessarem pelo assunto despertando a “curiosidade” – a alma do cientista – e levando-os a fazer suas pesquisas e estudos exatamente como os cientistas atuais fazem na sua vida profissional...

Continuando na sua linha de analogia entre “Ciência e Espiritismo” o cientista português afirmou mesmo que ser espírita é ser como um cientista, «… sermos homens e mulheres dos “Porquês..?” Querermos sempre sabermos mais. Compreendermos mais ainda para melhor conhecer a vida e conhecermo-nos a nós próprios… esta é a proposta impar que a Doutrina Espírita nos oferece. Uma doutrina lógica e racional, libertadora e consoladora… que consola o coração com a razão e liberta a mente com o amor…» atestou Luis de Almeida de forma surpreendente levando a audiência a interromper com uma salva de palmas…

Continua no post original.

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Acredito que isso nos demonstre que, no mínimo, é possível o diálogo aberto entre cientistas e religiosos. Contanto que sejam religiosos livres de dogmas, e cientistas livres do "ceticismo fundamentalista", ou pelo menos que considerem ir a uma palestra sobre religião para uma platéia de cientistas.

Crédito da foto: bluemedium5

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11.2.09

Crítica aos espíritas (3)

3. Do entendimento da Lei de Causa e Efeito

Muitos espíritas não entendem corretamente a Lei de Causa e Efeito (não é o mesmo que o Karma de doutrinas orientais).
Alguns associam essa lei ao dogma cristão de Céu/Inferno eternos, que é claramente refutado ponto a ponto em O Céu e o Inferno, de Kardec, e por qualquer pessoa com um mínimo de pensamento lógico.
Infalizmente esse dogma da pena eterna está tão incrustado na nossa sociedade ocidental, que por ignorância ou preguiça, muitos espíritas apenas substituem a Punição do Inferno Eterno pela Punição das Reencarnações Sucessivas em Sofrimento.

Ora, lógico que a idéia de reencarnarmos para expiar faltas passadas, por mais sofrida que seja e encarnação, ainda é bem mais lógica e justa do que a doutrina absurda do Inferno Eterno... no entanto, ainda esbarramos numa palavra que não tem razão de ser:

PU-NI-ÇÃO.

Ora, punição não existe... Ao longo da doutrina de Kardec, quantas vezes ouvimos que devemos antes agradecer por nossas adversidades, pois que é através delas que estamos realmente evoluindo moralmente, que ao longo da eternidade, é o que importa!
Mas quão difícil é para alguns espíritas compreenderem isso direito.
Pensemos na idade da Terra, 4 bilhões de anos, no tempo que o homem está aqui, milhões de anos, no tempo desde que Jesus esteve na Terra, 2 mil anos... E veremos que encarnações de 100 anos são como gotas no oceano do tempo eterno de Deus.

A Lei da Causa e Efeito não fala de punições, e sim de remédios e testes.
A todo doente devemos remediar a doença, e alguns remédios são amargos, mas curam mesmo assim!
A todo estudante devemos aplicar testes, para que demonstre a seus professores e confirme a si próprio que está em condições plenas de conhecimento sobre o que estudou. De que adiantaria uma escola que deixasse todos os seus alunos passar de ano sem testes? De que adiantaria uma outra que os expulsa sumariamente a qualquer erro de conduta ou falha, mesmo que grave?

Devemos sim nos dedicar para nos graduarmos o mais rapidamente possível, e não pensar em punições que existem só em nossa ignorância.

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Sobre a pena do Talião
Há um ponto que sempre me incomodou no espiritismo, a lei do Talião: olho por olho e dente por dente.

Eu defendo Gandhi quando ele diz:
"Olho por olho, e logo estaremos todos cegos."

Em O Céu e o Inferno temos casos de homens justos que morreram queimados em acidente, ou enterrados vivos (epilepsia de dias deixou-o como um cadáver), e etc. -- Depois ao se contatarem os espíritos eles diziam que fizeram isso para pagar na mesma moeda o que haviam praticado em vidas anteriores (mandar pessoas a fogueira no primeiro caso, no segundo jogar um criança num fosso e deixa-la para morte).

No entanto, em analisando os textos, mesmo se considerando que são meramente a visão dos espíritos que passaram por isso, é muito difícil qualquer um dizer que foi Deus quem impôs essas penas... Ou seja, o espiritismo pode evoluir, e já se passaram 150 anos. Hoje eu acredito que:

Esses espíritos não conheciam outra forma de justiça, e terminaram por aplicar a si próprios a pena do Talião.
Obviamente que na lei dos homens a pena do Talião é válida, então para apaziguar seu remorso e imensa dor moral após o desencarne (muito pior que a dor física de um possível Inferno), eles optaram por se sacrificarem dessa forma.

No entanto lembremos que Jesus disse: "Quero misericórdia, não sacrifício".
Portanto, acredito que espíritos mais evoluídos em sua moral escolhem sempre a CARIDADE para pagarem penas passadas, e não essas adversidades fatais. O maior exemplo disso é Chico Xavier: foi doente toda a vida, mas nenhuma dor física proveniente de suas doenças pôde impedi-lo de fazer caridade toda a vida... Portanto acredito que um espírito evoluído jamais escolha o sacrifício próprio acima da caridade com o próximo.

Vale lembrar que para um espírito fraco, escolher o sacrifício é mais fácil do que a caridade.
A caridade exige força de vontade, o sacrifício não, pois é escolhido antes do nascimento e quando o espírito não tem vínculos emocionais com a vida futura.
A caridade é uma obra em andamento, o sacrifício é um grito desesperado por reparação.
Ou seja, evolue-se pela dor ou pelo amor. Mas evolue-se sempre.

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Children of life

Hey you, child of life
Where did you come from?
From you and for you
What myths, histories and tales have been told?
What mysteries wait to be unfold?

Where exactly you are now?
Here or nowhere?
From where come that feeling
That feels like waves of unknown material
Like something so familiar
Yet so unreal?

Hey you, son of nature’s will
Aren’t the kingdom of God everywhere?
Inside and outside?
Aren’t the road that leads to ignorance
A dead end?
Aren’t the road that leads to nowhere,
(or somewhere)
A narrow path in the beginning
Although a broad path in the middle
And where nobody saw an ending?

From you and for you
Came the code for all there’s natural
Came the will and the love
To walk into that narrow path
To fade into that ending light
To unfold all the answers and all the questions
That men asked to the shines of night…

Hey you, child of life
Aren’t you so certain now
If you live to survive
Or only to be alive?

raph’09 (aka. Rafael Arrais, this blog's author)

***

Trata-se provavelmente do primeiro poema do qual a inspiração me chegou em inglês. A tradução para o português ficou assim...

Filhos da vida

Ei você, filho da vida
De onde veio?
Através de ti e para ti
Quais mitos e histórias foram contados?
Quais mistérios esperam por ser desvelados?

Onde exatamente está agora?
Aqui ou em lugar algum?
Por onde vem essa sensação
Que se sente como ondas de material desconhecido
Como algo tão familiar
Ainda que tão irreal?

Ei você, filho da vontade da natureza
Não está o reino de Deus em toda parte?
Dentro e fora?
Não é a estrada que leva a ignorância
Uma rua sem saída?
Não é a estrada que leva a lugar algum,
(ou algum lugar)
Uma rua estreita no início
Porém um caminho largo no meio
De onde ninguém vislumbrou o final?

Através de ti e para ti
Veio o código para tudo que é natural
Veio à vontade e o amor
Para andar por esta rua estreita
Para desaparecer na luz desse final
Para desvelar todas as respostas e todas as perguntas
Que os homens fizeram as luzes da noite...

Ei você, filho da vida
Não está tão certo agora
Se você vive para sobreviver
Ou apenas para estar vivo?

raph’09

***

Crédito da foto: Ibu

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10.2.09

O criacionismo de Spore

Em Setembro de 2008 o conceituado designer de jogos Will Wright realizou o projeto de sua vida: finalmente o jogo Spore era lançado. Will é conhecido por seus jogos de simulação, como Sim City, um simulador de administração de cidades que até o ex-prefeito do Rio, César Maia, jogava; ou The Sims, o jogo que "simula a vida real" e foi o grande responsável por uma legião de mulheres passar a se interessar por jogos de computador... Mas Spore foi algo muito mais ambicioso: um simulador do desenvolvimento de uma espécie de vida, desde os estágios celulares (em uma poça) até a conquista do espaço, após ter passado pelos estágios intermediários de criatura, tribo e civilização.

Não quero aqui analisar o jogo em si, que achei excelente (principalmente nas duas primeiras fases, geniais!), mas sim lembrar que foi lançado a poucos meses do ano em que a teoria de Darwin-Wallace para a evolução das espécies completa 150 anos, enquanto também comemora-se os 200 anos do nascimento de Charles Darwin. Ora, para os cientistas e céticos, nada mais oportuno do que se deleitar com um jogo tão educativo, e verificar que a ciência finalmente está chegando no "campo de visão" dos jovens, correto?

Nem tão depressa... Na verdade, muitos cientistas tem criticado Spore num ponto fundamental: por incrível que pareça, acaba por defender, de certa forma, o criacionismo, ou neo-criacionismo. Ora, sabemos que durante o jogo nossa célula vai evoluindo até virar peixe, depois uma espécie anfíbia, depois uma espécie que pode lembrar diversas outras conhecidas, de répteis a aves ou mamíferos, ou algo completamente novo e exótico... Isso porque é o jogador quem decide! É o jogador quem define como a espécie vai se desenvolvendo com seus "pontos de DNA". É simples identificar porque os cientistas céticos não gostaram muito da idéia: primeiro, não existem os tais "pontos de DNA", na verdade as espécies se desenvolveram pela seleção natural de mutações em seu próprio DNA ancestral - segundo, teoricamente não existe inteligência alguma por trás desse desenvolvimento das espécies. Será mesmo?

Segundo a Wikipedia nos fala sobre o Neocriacionismo:

"Apesar da predominância de correntes evolucionistas nos meios acadêmicos, alguns cientistas tornaram-se notados por defenderem o criacionismo clássico, que envolve a crença num criador. Os argumentos de pessoas pertencentes a comunidade científica em favor do criacionismo apontam para a organização e exatidão das leis naturais. Essa visão dá uma imagem que parece com aquela proposta por Isaac Newton, ao comparar o mundo a um mecanismo que evidencia um projeto inteligente e sobrenatural."

Ou seja, me parece irônico e pitoresco que exatamente no jogo eletrônico onde mais se investiu em estudos para que a ciência fosse corretamente retratada, tenhamos o velho dilema do Evolucionismo vs. Criacionismo... Porém, não seria o caso de nos perguntarmos se, em realidade, as coisas não sejam exatamente uma mistura das duas teorias? Será que antes não se complementam, antes de se exlcuir mutuamente?

De fato, a teoria de Darwin-Wallace nunca pretendeu explicar a origem da vida, apenas a forma pela qual ela se desenvolveu na Terra. Porém, mesmo lembrando que os elementos químicos que teoricamente possibilitaram o surgimento da vida no planeta tenham chegado aqui através de asteróides nômades, há que se perguntar - "mas e de onde exatamente vieram esses elementos?" - Pois ainda que toda a evolução das espécies na Terra seja fruto do código gerado por tais elementos, fica a questão de quem ou o que os criou, e se não teve um objetivo inteligente ou consciente. Afinal, todo efeito tem causa, e todo efeito que gera consciência teoricamente teve causa consciente. Lógica pura e simples.

Mas não temos provas: nem para o Evolucionismo (dentre os problemas podemos citar as grandes "lacunas" entre espécies de hominídeos, assim como o mistério do grande salto da consciência humana), nem para o Criacionismo (basta lembrar que "deus" ainda não desceu na Terra e nos informou de seus planos divinos, ou pelo menos não nos deixou nenhuma prova científica de que tenha feito isso). Então, só nos resta continuar jogando Spore, e ponderando sobre a grande questão... "Como você criaria o Universo?"

***

Crédito da imagem: minha espécie no Spore

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Tudo que sei é que nada sei

O célebre sábio antigo, Sócrates, nem sempre havia sido conhecido por sábio. De fato, chegou a servir como soldado e constituir família, como tantos outros atenienses. Foi somente quando leu no oráculo em Delfos o "conhece-te a ti mesmo" que teve um insight, uma iluminação interior, e resolveu dedicar o final de sua vida ao autoconhecimento.

Porém, me parece interessante que não tenha se isolado para se autoconhecer, tanto oposto disso: preferiu dialogar com jovens atenienses, e através desses diálogos pôde não somente conhecer-se melhor, mas também aprender a complexa arte de julgar "quem é sábio, e quem apenas se julga sábio".

Frequentemente, os ditos "sábios" se entrincheiram no cume de sua suposta sabedoria, e passam a atacar todos aqueles que, ao aproximar-se, demonstram certa ignorânica. Dizem eles: "Você não é digno de estar entre nós, é muito ignorante." - "Vá estudar o básico de filosofia, ciências e política, depois retorne." - "Para mim é um suplício ter de dialogar com alguém tão ignorante." - ou ainda "você está além de qualquer salvação, nunca poderá ser um sábio como nós."

Ora, e o que Sócrates descobriu? Que os ditos "sábios", nada mais eram que seres cheios de idéias pré-concebidas, ou tanto pior, conceitos monolíticos que não admitiam diálogo, verdadeiros dogmas das idéias... Descobriu que para ser realmente sábio, era preciso aprender a compreender as diversas formas nas quais a sabedoria se apresenta: no olhar atento de um jovem ainda livre de preconceitos, nas sutis e harmônicas leis da Natureza, no conceito de se estar sempre ao mesmo nível de todos - não por ser igualmente ignorante, mas antes por ser o mais interessado em aprender com tudo a sua volta...

O tão criticado "tudo que sei é que nada sei", portanto, é apenas uma fórmula para que possamos nos harmonizar com o brilho dos outros, se for o caso. Caso nossa sabedoria brilhe muito a primeira vista, pode assustar, afinal todos os ditos "sábios" costumam tratar aos "ignorantes" de forma um tanto grosseira. A sabedoria verdadeira está em, sendo sábio, reconhecer que não é sábio o suficiente para que possa ignorar o aprendizado possível, o aprendizado que se encontra nos diálogos, nas amizades, no convívio e no amor, para com todos os outros que nos cercam, sejam sábios, sejam ignorantes, sejam apenas ignorantes que se julgam "muito sábios" - não importa, todos são possibilidades infinitas de aprendizado.

O cérebro humano tem tantos neurônios quanto estrelas há no céu. Não importa para onde olhemos: para o alto, ou para dentro, tudo é sagrado. Amar o saber, antes de mais nada, é reconhecer que nunca saberemos o suficiente, que não possamos aprender algo a mais. Sócrates sabia. Sócrates não se "julgava sábio", ele o era, realmente, e não se preocupava em alardear isso aos quatro ventos.

***

Crédito da foto: Sebastià Giralt

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9.2.09

Os pequenos selvagens

Era 1920, o reverendo Jal Singh, missionário anglicano, liderava aldeões em uma caçada nos arredores de Midnapore, a oeste de Calcutá, na Índia. Esses aldeões eram acostumados a caçar todo tipo de animal selvagem nas redondezas, mas dessa vez sua caçada era algo mais exótica: eles buscavam as meninas Amala e Kamala, que boatos diziam, haviam sido largadas nas florestas da região quando ainda bebês, e então foram "adotadas" pelos lobos, e passaram a viver como seres selvagens, embora humanos.

O que parece uma ficção, em realidade, é algo que sempre foi relativamente comum na história antiga, e nos povos rurais. Amala e Kamala realmente existiram. Quando foram abordadas, sua mãe loba as tentou proteger, e foi abatida pelos aldeões. Jal Singh acreditava que as estava tirando "da mão do demônio", e dando-as uma oportunidade de serem humanas, educadas, instruídas em sua religião e, finalmente, ganharem os céus ao aceitar Jesus como seu único salvador.

Infelizmente não foi bem o que ocorreu. Elas tinham provavelmente entre dois e oito anos, Singh as descreveu - "caninos alongados, queixo retraído, olhos que brilhavam na escuridão." Amala era a mais nova, e morreu em um ano de "cativeiro", sem nunca ter aprendido a falar ou sequer caminhar de forma ereta. Kamala sobreviveu até 1929, tempo em que aprendeu a comer alimentos cozidos (e não carne crua, como anteriormente), andar ereta e falar cerca de 50 palavras. Singh deve ter lamentado, não era o suficiente para que compreendessem Jesus, nem para que chegassem aos céus.

Na Idade Média, as crianças criadas pelos animais eram vistas como símbolo do caos, da insanidade, heresia, maldição de Deus. Mais tarde, o iluminista Russeau envolveu todos os homens não-civilizados em uma aura de pureza e harmonia com natureza chamamdo-os de "nobres selvagens". Mas o fato é que isso tudo apenas nos demonstra o quanto precisamos uns dos outros, o quanto estamos encadeados na teia da vida: o homem é um ser de potencialidades, mas essas precisam ser despertas para florescer.

Fosse Mozart criado por lobos, teria sido um gênio da música? Decerto que não, decerto que se não houvesse sido apresentado pelo pai a um piano ainda muito pequeno, não teria sido tão genial. Todo espírito humano traz nos calabouços do inconsciente toda uma história de evolução cognitiva, história essa que a ciência ainda não compreende como pode ser passada geração a geração, visto que genes determinam apenas características físicas, e não morais ou cognitivas... Essas "potencialidades da alma", no entanto, como bem lembrou Sto. Agostinho no livro homônimo (também herança do pensamento de Sócrates - "conhecer-se é relembrar"), dependem de serem despertas, dependem de serem desenvolvidas em prol de toda a humanidade. O ser humano criado por lobos será não muito mais do que um lobo, mas o lobo criado por seres humanos não possui essas potencialidades, e portanto será, no máximo, um lobo "menos feroz".

Fôssemos um povo consciente de sua herança ancestral, de sua longa ligação com todas as formas de vida nessa Terra, em vidas e vidas de evolução cognitiva e moral (em paralelo com a evolução tradicional esclarecida pela teoria de Darwin-Wallace), não deixaríamos nossas crianças para serem devoradas nos ermos, mas da mesma forma, não assassinaríamos os lobos que cuidaram de nossas crianças, pois que nesse sistema sagrado cada um recebe a responsabilidade que lhe compete: o lobo que criou a criança é um animal em vias de emancipação da consciência; o homem que matou o lobo e pretendeu "salvar" a criança é um ser consciente ainda preso na própria ignorância e preconceitos.

Nos dias que se seguem, o homem finalmente compreendeu que tudo que faz a Natureza, faz a si mesmo. Agora chegou a hora de voltarmos a viver, e não apenas sobreviver. Chegou a hora de lembrarmos dos índios e aborígenes que sempre souberam de seu lugar no grande esquema das coisas. Chegou a hora de nos reconectarmos a Natureza, de curar todo mal feito, e de sermos tão puros quanto Amala e Kamala, porém no exercício pleno de todas as nossas potencialidades... Não vamos mais negar quem somos, e o que viemos fazer nesta Terra.

***

Crédito da foto: anônimo

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Acreditando nisso

Se sorrimos por ver alguém sorrir
Ou choramos por ver outro sofrer,
Não será talvez por sermos, antes de mais nada,
O mesmo ser?

Se há muito tempo atrás um sábio escreveu
Da conversa admirável entre criador e criatura...
Se outros acreditavam em vários criadores,
Deuses do sol, das chuvas e dos trovões...
Se o profeta da montanha liderou seu povo errante
Para longe das pirâmides e faraós...
Se o rabi da Galiléia veio falar sobre seu Pai
Para os ignorantes no deserto...
Se o príncipe do oriente deserdou a corte
E meditou nas florestas de bambu...
Se o amigo dos pássaros fugiu das cruzadas
Indo encontrar a paz em seu mosteiro perdido...
Ou se há pouco tempo atrás outro sábio sentou,
Esperando pacientemente que os invasores se fossem...
Não será, tudo isso, porque deveríamos amar
Ao ver outros amando tão poderosamente,
Tão maravilhosamente; Amando tanto
Mais do que nós?

Se uns acreditam nisso e outros naquilo,
Ou se matam uns aos outros em nome dessa fé,
Não será por essa fé ser a mais cega dentre nós?
A fé que não vê sorrisos ou lágrimas,
Que não veio da boca dos profetas,
Mas da cegueira dos que vieram depois,
Lutando por riquezas, denegrindo certezas,
Amando tão pouco, sabendo tão pouco,
E querendo tudo... Tudo o que não passa
Dessa vida de ilusões...

Se estamos aqui nesse mundo maravilhoso,
Carregando essa dor por tanta destruição,
Tanta falta de amor, tanto ódio e desilusão,
Não será porque deveríamos aprender
A mais simples das questões?
Que somos uma só família,
Criados pelo mesmo criador,
Que vamos aqui permanecer
Apenas somente enquanto não formos capazes de ver
Com nossos próprios olhos e coração,
Que o amor veio antes de tudo,
Antes dos profetas, dos territórios e das riquezas...
Antes da tristeza e da solidão
Por não conseguirmos mais ter
Descanso em nosso ser...

Se iremos aqui permanecer
Por mais dois mil, dez mil anos,
Será antes por não aceitarmos que somos apenas
Um ser permeado por infinitos seres,
Envoltos pelo universo que continua a girar,
Como sempre o fez,
Indiferente a paz ou a guerra,
Mas que sempre nos desejou a verdadeira fé...
Para os que acreditam nisso ou naquilo
Pudessem enfim acreditar
Em si mesmos.

raph’02

Crédito da foto: Americo Rui Pacheco

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6.2.09

Chico Xavier: charlatão?

Este artigo não trata de ataque a Chico Xavier, mas sim de sua defesa. O título é para atrair aqueles que pesquisam no google por "textos prontos" (geralmente pelas palavras-chave "Chico Xavier charlatão" ou "Chico Xavier fraude") para poderem atacar a memória de Chico em discussões online. Se era essa a sua intenção, me desculpe, mas lhe convido a refletir um pouco mais sobre a natureza dos ataques gratuítos a Chico - afinal, porque será que ele incomoda tanto?

Segundo a Wikipedia e suas fontes, Chico Xavier psicografou quatrocentos e doze livros. Nunca admitiu ser o autor de nenhuma dessas obras. Reproduzia apenas o que os espíritos lhe ditavam. Por esse motivo, não aceitava o dinheiro arrecadado com a venda de seus livros. Vendeu mais de 20 milhões de exemplares. Cedeu os direitos autorais para organizações espíritas e instituições de caridade, desde o primeiro livro.

Suas obras são publicadas pelo Centro Espírita União, Casa Editora O Clarim, Edicel, Federação Espírita Brasileira, Federação Espírita do Estado de São Paulo, Federação Paulista do Rio Grande do Sul, Fundação Marieta Gaio, Grupo Espírita Emmanuel s/c Editora, Comunhão Espírita Cristã, Instituto de Difusão Espírita, Instituto de Divulgação Espírita André Luiz, Livraria Allan Kardec Editora, Editora Pensamento e União Espírita Mineira.

Apesar disso, o ataque mais comum a Chico parte dos céticos que afirmam que ele era um charlatão em busca de ganhos financeiros: que a renda de seus livros eram doados a instituições sem fins lucrativos, que não pagavam impostos, e lhe retornavam esses lucros em forma de "mimos" e outros auxílios. Vamos então analisar a lógica do ataque:

1- Seus 20 milhões de livros vendidos não eram sequer publicados pela mesma editora, e sim dúzias de editoras diferentes. Eram, portanto, todas parte de um "conxavo secreto" para favorecer os supostos ganhos sem impostos?

2- Os impostos insidem nos livros em si, só não insidem nas desepesas administrativas das editoras. Apesar disso, a maior parte dos livros de Chico é vendida por quantias bem abaixo da média editorial no país. Será mesmo que essa era uma boa estratégia para se obter lucro?

3- Não seria mais fácil para Chico simplesmente ficar com o valor dos direitos autorias de seus livros, desde o início? Muitos autores espíritas vendem milhares de exemplares (alguns, como Zíbia Gasparetto, milhões deles) e mesmo assim "embolsam" os direitos autorais - está perfeitamente de acordo com a lei, que é laica e não reconhece o direito de supostas entidades sobrenaturais (e, mesmo assim, elas não poderiam usar o dinheiro).

4- Porque Chico viveu a vida toda em residência humilde, sustentado por sua aposentadoria, e atendendo pessoas de segunda a sábado sem cobrar nada? Porque não decidiu pelo menos gastar essa "suposta bolada" no fim da vida? Porque, pelo contrário, trabalhou cada vez mais e mais, até o limite, quando seu corpo não podia mais lhe atender? Porque, enfim, não passou o fim da vida desfrutando de sua riqueza, viajando o mundo, quem sabe visitando locais espirituais como Índia ou Nepal?

5- Porque um suposto charlatão recebeu a maior audiência em porcentagem da TV brasileira nos programas Pinga-fogo da TV Tupi em 1971 (maior até do que a da final da copa de 70)? (*)

6- Porque um suposto charlatão concorreu ao prêmio nobel da paz em 1981 e na votação para o Maior Brasileiro da História realizada pela revista Época na internet, obteve 9.966 votos, ou 36% do total, ficando em primeiro lugar? (*)

7- Ainda mesmo que Chico tivesse recebido alguns "mimos" de algumas dessas editoras, seriam então um pequeníssima parte da porcentagem de direitos autorias a que teria direito de qualquer forma - me escapa a lógica do ataque.

Ou seja, um ataque no mínimo absolutamente ilógico. Os céticos tem todo o direito de crerem no que quiserem, mas é interessante que nesse caso se usem de boatos obscuros e supostas entrevistas com ex-coordenadores de centros espíritas que "recebiam todos uma parte da bolada" - ora, ora, caso soubessem procurar em fontes mais sólidas, de prerência na biografia "As Vidas de Chico Xavier" (publicada pelo grupo espanhol Planeta, que não é espírita, e escrita pelo jornalista cético Marcel Souto Maior) ou mesmo nas próprias obras de Chico, que tratam de poesia a história antiga, de espiritualiadade a ciências (de fato, o livro "Mecanismos da Mediunidade" está em linguagem puramente científica) e às vezes também de polêmicas descrições da vida no "plano espiritual" - então talvez tivessem a oportunidade de construir uma opinião mais embasada e, porque não dizer, realmente cética.

Antes que digam que sequer considerei a lógica do ataque, vale retornar a mesma reportagem da revista Época (do link logo acima):

"Nos anos 70, Chico foi acusado de favorecer atores e políticos e deixar de atender as pessoas humildes. Também surgiram denúncias de venda de ingressos para visitas. Até o fim de seus dias, Chico recebeu, todos os sábados, milhares de crentes de todo o Brasil. Primeiro em Pedro Leopoldo, depois em Uberaba, para onde se mudou em 1959, quando já era uma celebridade. Nunca se conseguiu comprovar que o médium soubesse da movimentação financeira em torno de seu nome. Seu filho adotivo, Eurípedes Higino dos Reis, chegou a ser investigado pelo Ministério Público. De acordo com a Federação Espírita Brasileira, os direitos autorais dos livros de Chico Xavier, cedidos em cartório, beneficiam mais de 100 mil famílias. Chico Xavier dizia viver da aposentadoria como escriturário do Ministério da Agricultura."

Ou seja, a consciência de cada um que julgue o que faz sentido, e o que não faz...

***

No "bate-pronto", outros comentários acerca de ataques comuns a Chico Xavier

Chico sofria de auto-engano.
Muitos céticos analisam dessa forma, e devem ser respeitados. Não acho desrespeitoso analisá-lo dessa forma, pois antes reconhecem que foi um homem de bem que praticou a caridade a vida toda - no entanto, falta explicar como um homem humilde do interior de minas, com segundo grau incompleto, escreveu tanto e sobre tantos assuntos diversos. Ainda assim, portanto, um desafio para a psicologia moderna.

Chico era doente mental.
De certa forma, parte do mesmo pressuposto acima, apenas tende a ser mais desrespeitoso o julgamento, afinal, mesmo em sendo doença mental, fica faltando explicar que tipo de doença era essa, que permitia a um homem falar horas em TV ao vivo, para todo um país, e não gaguejar, nem falar algo aparentemente "louco" ou "ilógico" de antemão (ah não ser, claro, para os preconceituosos).

Chico treinava a "escrita-automática" e porisso escrevia tanto.
Bem, decerto ele "treinou" muito então, "treinou" a vida inteira - mas falta explicar como psicografou diversos livros em conjunto com Waldo Vieira, onde um trazia os capítulos pares, e outro os ímpares, separados por quilômetros de distância entre suas respectivas cidades, e no fim o livro fazia total sentido de coerência, sem precisar ser editado na mínima vírgula, aparentemente. Teorias como a "escrita-automática" ou o "quase mítico" Inconsciente Coletivo falham em explicar esse fenômeno em específico, a não ser que postulemos que as informaões ficam "flutuando pelo ar" apenas à espera que os "escritores automáticos" as usem - nesse caso, em que isso diferiria exatamente da lógica espiritualista?

Porque Chico viveu doente? Porque um curandeiro não procura outro curandeiro?
Chico não era curandeiro, nem nunca pretendeu ser. Chico psicografava mensagens escritas em papel, e supostamente recebia influência de seu guia espiritual, Emmanuel, toda vez que ia falar em público (como foi o caso no Pinga-fogo). A lógica das enfermidades de Chico está na "Lei de Cause e Efeito" da doutrina espírita, caso queiram saber.

Gostaria de sugerir um tema. Por que vocês não desmascaram as práticas espíritas de Chico? Adoraria ver seus seguidores humilhados pela ciência. (texto comum em blogs sobre dismistificadores).
Ora, Chico também escrevia sobre ciência! O espiritismo não pretende negar a ciência, mas ir "adiante" onde a ciência tradicional ainda não se atreve a meter o nariz. Segundo o espiritismo, caso a ciência prove experimentalmente algo que vá contra a doutrina espírita, é a doutrina que tem de se adequar a ciência, e não ao contrário. O codificador da doutrina, Kardec, era ele mesmo um homem de ciências. Em tempo: a única "prática espírita" de Chico era a psicografia, e temos diversas áreas da psicologia e parapsicologia para estuda-la. Em relação a hipótese do espírito existir, temos estudos de Experiência de Quase Morte, casos de crianças que se lembram de vidas passadas, terapias de regressão de memória, dentre outros estudos científicos (independente de admitirem ou não a hipótese, a estão estudando de maneira científica e honesta).

Segundo a Bíblia a prática de necromancia é condenada.
Espiritismo não é necromancia, a palavra "espiritismo" foi cunhada por Kardec a menos de 2 séculos e não poderia constar na Bíblia. No mais, fica difícil compreender como Jesus falou com Moisés em uma tenda (Elias foi "arrebatado aos céus", mas Moisés estava "morto" a séculos).

Chico era gay.
Um caso clássico de auto-confissão de preconceito por parte de quem ataca. Não que fizesse alguma diferença, mas ao que tudo indica Chico desencarnou ainda virgem. Além disso, tinha uma posição que agradaria muitos defensores do fim do preconceito para com homossexuais.

***

A resposta habitual de Chico (aos ataques)

"A doutrina é de paz... Emmanuel tem me ensinado a não perder tempo discutindo. Tudo passa... As pessoas pensam o que querem a meu respeito – pensam e falam. Estou apenas tentando cumprir com o meu dever de médium. Companheiros escrevem fazendo insinuações em torno da obra dos espíritos por meu intermédio... O que posso fazer? Estamos numa doutrina de livre opinião. Devo prosseguir trabalhando. O meu compromisso é com os espíritos... Não pretendo ser líder de nada. Estou consciente de que tenho procurado fazer o melhor e sou grato aos nossos Benfeitores por não me terem permitido uma vida inútil. Um dia, nós vamos compreender a necessidade de uma união mais profunda – quando sentirmos ameaçados pelas religiões intolerantes, que estão crescendo muito..."

Jornal O Ideal - Nº 56 - Janeiro de 2000

***

(*) Numa análise mais cética, estes argumentos podem cair na falácia do "apelo a autoridade". Porém, não esqueçamos que o Pinga-fogo de 1971 foi um esforço jornalístico para tentar fazer Chico cair em contradição e/ou "desmascará-lo", e todos sabem que teve o efeito oposto: tornou-o um mito no país. No mais, os outros argumentos não dependem desses para se sustentar.

Este artigo também pode ser visualizado pelo endereço http://tinyurl.com/chicoxavier

Artigo relacionado: Um médium notável

Crédito da foto: Wikipedia

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A história de um tópico

Vai fazer um ano que o tópico "A Pergunta de Aristóteles" vem sendo discutido na comunidade Física Quântica - A Revolução, do Orkut. Como havia postado anteriormente, o tópico trata de possível existência do espírito, e de como este se ligaria ao corpo. Nesse interim, o tópico obteve mais de 5 mil respostas, e formou algumas amizades... nem todas apenas entre espiritualistas.

A comunidade em questão trata de física quântica e sua possível, e polêmica, relação com a consciência humana. Isso dá margem para algumas discussões sérias sobre os paralelos entre ciência e espiritualidade, algumas discussões extritamente científicas e, como era de se esperar, um monte de "baboseira quântica" que, na maior parte das vezes, não é nem científica nem espiritualista - "florais quânticos", "bissexualidade quântica", dentre outros... Com o tempo, e o acúmulo de tópicos fora da proposta da comunidade, os moderadores decidiram deletar os novos tópicos que não tivessem nenhuma relação com a quântica, mas este de que falo felizmente foi respeitado e mantido "vivo".

Minha reflexão não é sobre nada do que é discutido no tópico em si, mas sobre sua relação com o restante da comunidade, ou seja, com os céticos que lá frequentam. Por vezes, me peguei a imaginar o que será que pensavam sobre o tópico, pois sei que muitos as vezes davam uma olhadela - "O que será que esses malucos devem estar falando agora?" - deveriam pensar... Mas não é interessante que tenham aprendido a conviver com isso? Que, ao contrário de alguns "céticos evangelizadores", não tenham julgado-nos imbecis de antemão, ou completos ignorantes em ciência e física quântica? Talvez o fato de um dos que respondiam frequentemente ser um físico-ocultista tenha ajudado, mas não acho que tenha sido essencial. O fato é que os céticos aprenderam a conviver com os espiritualistas "ali na sala estranha da comunidade".

Acredito que nós (espiritualistas confessos) aprendemos também que nem todos os céticos são "evangelizadores" - "Vocês não podem acreditar em X e Y, essas teorias não são científicas e os farão cada vez mais estúpidos, vocês devem acreditar em W e Z, que são de acordo com a ciência!" - e que mesmo alguns operam quase numa relação de curiosidade descompromissada em relação a espiritualidade, como Bohr fez com o I Ching, como decerto muitos cientistas da história tenham feito, e tirado alguma inspiração daqui e dali.

No meio do caminho, também apareceram os "crentes", do tipo que acredita que já encontrou a Verdade Absoluta em um livro. E eles, a semelhança dos "evangelizadores" do parágrafo acima, também falaram - falaram - falaram - e não ouviram absolutamente nada - e se retiraram.

Que possamos, céticos e espiritualistas, tirar alguma lição desse tópico - que é possível que o outro, mesmo tendo uma crença (ou descrença) aparentemente absurda para nós, nos ensine algo, ou mesmo muitos "algos" - melhor falar sobre o que acreditamos ser nossa verdade atual, mas manter os ouvidos "destravados" para também ouvir, afinal aquele que diz "cheguei a Verdade Absoluta" é possivelmente o maior ignorante.

***

Completo com a reflexão do amigo Abenides, que deu origem ao tópico em questão:

Este tópico sobreviveu por vários motivos.
Pela liberdade de manifestar o pensamento;
Pelo treinamento do respeito às idéias alheias;
Pelo combate ao fanatismo;
Pelas idéias coerentes, embora contrárias ao nosso pensar;
e também pela qualidade dos participantes, por que não?

Aqui as pedras se batem para polir e não para soltar faiscas.

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Crédito da imagem: TheAlieness GiselaGiardino (clicando na imagem ela abre em tamanho maior - trata-se da relação entre o I Ching e o Genoma)

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5.2.09

A discussão inútil

Trecho do livro "O problema do ser, do destino e da dor", de Léon Denis (publicado pela FEB - primeira edição, páginas 427-428):

"Não discutas, pois, mas trabalha. A discussão é vã, estéril é a crítica. Mas a obra pode ser grande, se consistir em te engrandeceres a ti mesmo, engrandecendo os outros, em fazeres o teu melhor e mais belo. Porque não deve esquecer que para ti trabalhas, trabalhando para todos, associando-te à tarefa comum. O Universo, como tua alma, renova-se, perpetua-se, embeleza-se sem cessar pelo trabalho e pela reciprocidade. Deus, aperfeiçoando sua obra, goza dela como tu gozas da tua, embelezando-a. Tua obra mais bela é tu mesmo. Com teus esforços constantes podes fazer de tua inteligência, de tua consciência, uma obra admirável, de que gozarás indefinidamente. Cada uma de tuas vidas é um cadinho fecundo do qual deves sair apto para tarefas, para missões cada vez mais altas, apropriadas às tuas forças e cada uma das quais será tua recompensa e tua alegria.

Assim, com tuas mãos irás, dia a dia, moldando teu destino."

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Por vezes, ler Léon Denis chega a doer a alma, tantas as verdades que se insinuam sorrateiras por trás de sua magnífica escrita, e que nos fazem encarar nossos defeitos de frente. Será à toa que o "filósofo do Espiritismo" tinha seu nome circunscrito ao de Kardec (ou seja, Hippolyte Leon Denizard Rivail), ou será brincadeira de almas que já se encontraram muitas vezes no passado?

Léon Denis não foi perfeito, e guardava alguns defeitos próximos aos de Kardec (de certa forma, eram "almas-irmãs"), mas sua qualidade moral e intelectual superou em muito seus defeitos.

Nos dias atuais, em que ainda é tão comum vermos a discussão inútil entre espíritas e não espíritas, por se focar apenas "no que está provado e no que não está" ou "no que é condenado pela Bíblia e no que é permitido", vale a leitura e releitura dessa breve passagem (acima), a que eu resumiria assim: "uma discussão de crenças é vã, se não for constrututiva, se não for em prol da renovação moral de todos nós". Talvez, devêssemos discutir, se for o caso, sempre ao ar livre, de preferência no topo de uma montanha, para não esquecermos nem por um instante o quanto nossa discussão é pequena, e o quanto a Natureza é grande.

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Veja outros livros de Léon Denis - download gratuíto.

Crédito da foto: Marcio Eugenio

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4.2.09

O valor da vida

Era um dia tranquilo no terreiro de Pai Tomás. Seus seguidores, umbandistas, contavam orgulhosos que em décadas de trabalhos com entidades, nunca houve um único trabalho que visasse prejudicar a alguém. Apesar do preconceito de muitos para com sua religião, os umbandistas do terreiro de Pai Tomás estavam tranquilos consigo mesmos, não se preocupavam com a crença e a descrença alheia, e sempre respondiam com sorridelas quando perguntados "se eram macumbeiros": "Faço macumba sim, mas minha macumba é do bem, irmão."

No entanto, após as festividades e oferendas de frutas aos orixás, lá pelo final da tarde, uma picape estacionou na entrada do terreiro - Era daquelas importadas, e com vidro escuro, talvez fosse até blindada, quem sabe? - O fato é que de dentro do carro saltou um homem visivelmente aflito, de olhar frio, bem vestido, e ele "exigia" ver o Pai Tomás o mais breve possível.

Ninguém ofereceu resistência, todos que vinham conversar com Pai Tomás eram atendidos, apesar de que aquela era a primeira vez que alguém chegara de picape importada nas redondezas do terreiro. "Deve ser maluco, graças ao bom Exu não foi assaltado passando por essas bandas" - pensavam os seguidores, na grande maioria bem mais humildes que o sapato lustroso do visitante.

Este, ao finalmente deparar-se com Pai Tomás, disse exaltado:

"Olá, me disseram que o senhor é de confiança, que o trabalho aqui é poderoso mesmo... Posso confirar?"

"Cada um confia no que quer. Mas, já que está aqui, me diga qual é esse trabalho de que precisa, pois pode ser que possa lhe ajudar" - respondeu-lhe o ancião, com um leve sorriso por traz da negra barba branca.

"Eu preciso de trabalho de morte, para matar!" - e retirando a carteira do bolso, preossegiui - "Dinheiro não é problema. Um sujeito me ferrou nos negócios, preciso mata-lo, não vou descansar enquanto não estiver bem morto e enterrado. Que morra de doença ou acidente, se o "exu" não te ajudar, pode matar do jeito tradicional, contanto que ele morra!"

Pai Tomás então analisou o sujeito com seu olhar pacato, olhou fundo em seus olhos, até o ponto de quase assustá-lo e fazê-lo retornar de onde veio, e disse lentamente dentre uma e outra baforda de cachimbo pelo ar:

"Você me parece tão cansado meu filho. Façamos o seguinte: o senhor fica aqui até mais tarde, que lhe daremos banho, colocaremos pote de canjica na cabeça para ver se dá uma limpeza nessa confusão toda aí, daí o senhor dorme, e quando estiver de saída, eu te digo quanto vai custar o trabalho."

Todos acharam estranho Pai Tomás não ter recusado prontamente um trabalho tão sombrio. Sentiam repulsa daquele homem amargurado, obssecado pela morte de outra pessoa, mas mesmo assim seguiram com os banhos e o tratamento... Ao final, o sujeito acabou dormindo por quase duas horas, e quando acordou, se dirigiu ao Pai Tomás sorridente:

"O Pai tinha razão, estou bem mais tranquilo agora, quase fico relaxado em saber que aquele crápula vai pagar pelo que fez. Mas, enfim, quanto é que isso vai custar? Não se preocupe que eu sei que esses "trabalhos" são os olhos da cara, eu sou sujeito rico!"

O ancião, amigo de orixás e entidades de luz, fitou-o brevemente e respondeu:

"O senhor volta para casa e pensa durante a noite: quanto vale a sua vida? Daí assim que tiver esse valor, o da sua vida, o senhor volta e me traz, que vai ser o valor do trabalho."

 

Não se sabe se o sujeito rico conseguiu eliminar quem desejava, o fato é que nunca mais foi ter com Pai Tomás.

 

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Conto baseado em supostos fatos reais relatados pelo amigo Daniel. Os nomes são fictícios.

Crédito da foto: Paula Sacchetta

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